terça-feira, 28 de janeiro de 2020

A FONÉTICA LUSO BRASILEIRA

Toda gramática tem por objeto cuidar da morfologia, da sintaxe e da fonética, na normalização de um idioma. Assim a fonética é uma das vertentes do estudo da gramática 




A FONÉTICA 

Trata-se de ponto fundamental de um idioma. A fala constitui o meio de comunicação entre as pessoas de uma região ou país. A língua escrita obedece a normas rígidas no arranjo das palavras para formar um pensamento. O vocabulário é a base. E a fonética? 
A fonética, isto é, a fala, é um idioma vivo, transferível por contaminação. Mutável e adaptável. Sem lei. Assim o foi na transformação do latim em línguas românicas. Cada uma delas com suas características especiais, mas resguardando-se a origem ou propriamente a sua paternidade. Daí, do Latim Vulgar, latim do povo, latim mal-falado, latim diversificado, surgiram o português, o francês , o italiano, o espanhol, o, catalão, o galego, o provençal e o romeno. São chamadas de línguas latinas. 

E o que acontece com o idioma português? 

Estruturalmente está firme nas reformas ortográficas e na preservação da sintaxe. O vocabulário sobrevive. A fonética caminha num barco sem timoneiro. Para onde?  Em qualquer idioma, a fonética é a disciplina que analisa como produzir e perceber os sons criados pelo sistema vocálico.  É o estudo da fala. Envolve: 
A acústica, que estuda as características físicas dos sons que compõem a fala, a fonética auditiva, o estudo dos processos que são realizados por quem recebe e interpreta a onda sonora. 
A fonética é representada pelo Alfabeto Fonético Internacional(AFI), um sistema de notação baseado no alfabeto latino. A ideia, por trás da criação do AFI, é a de se definir símbolos fonéticos que possam ser compartilhados por mais de um idioma, simplificando o aprendizado de línguas. 
Os caminhos da Língua Portuguesa falada são vários. Observe-se que não se fala como escreve e nem escreve como se fala. O povo cria as suas maneiras próprias de falar o seu idioma, e a cultura local interfere nesse caminho. 
O português falado no Brasil, com 210 milhões de habitantes, carrega a língua portuguesa, sem dúvida. Hoje, o português falado em Portugal difere em várias regiões do Brasil. Em princípio, no Brasil, preservam-se as vogais nas articulações, com aproximação à língua italiana na formação dos fonemas ou sons. A interjeição “Ah” tem um só fonema. “Ca/za” tem dois fonemas. 
  •  O brasileiro gosta de vogais. Portugal valoriza as consoantes, aproximando-se mais da língua francesa. (esperança ou sprança). Procura-se eliminar as vogais. 
  • Na filologia, de outra forma, no final de todas as palavras, a vogal “E” tem som de I. Pense em termos como: alface, doce, alegre e até nomes próprios como Liliane. 
  • Da mesma forma, no final das palavras, a letra “O” é pronunciada como “u”, (contu); Monteiro (Monteiru); século (séculu), mas permanece quando são acentuadas: (Maceió, avô e avó.) 
  • A letra “L” assume também divergências. Nos dialetos ou regionalismos, assume vários sons diferentes, como (carnavau, Brasiu, carma ou caima, calma. (Influência do Nhengatu, língua do tronco Tupi). 
  • A letra “R” vem com suas características. No fim das palavras pode aparecer com sonato caipira ou gutural ou desaparecer, como corrê, brincá.
  • A letra “S” pode soar como x ou z (casa) 
  • A letra “X” é a mais versátil. (exame, blindex, enxame, exportação, táxi) 
E a nasalização? O Nhengatu era um idioma fortemente nasalizado. O brasileiro recebeu essa herança.A nasalização é a vocalização que sai do nariz, principalmente com as letras “M e N”. irmã, manhã. Outro caso em que a nasalização é uma parte importante da pronúncia das palavras é quando elas levam o acento til (~), (manhã, irmã) .

Tente ler em voz alta os textos abaixo, como teste de hiper nasalidade; tampando o nariz com dois dedos: 

“Os homens estão sempre descobrindo luas em torno de planetas, distantes em muitos sistemas planetários. Mas, muitas luas são descobertas em torno de numerosos planetas".

“O gato espreguiçou-se e estirou-se sobre o sofá. Paulo, que saía, ao vê-lo, recordou que precisava deixar-lhe água, pois logo precisava sair e a tigela estava vazia.” 


Variação linguística – A língua em movimento 

É um fenômeno que acontece com a língua e pode ser compreendida por intermédio das variações históricas e regionais.  Em um mesmo país, com um único idioma oficial, a língua pode sofrer diversas alterações, feitas por seus falantes. Como não é um sistema fechado e imutável, a língua portuguesa ganha diferentes nuances. (Obs. O Marquês de Pombal, Sebastião José de Carvalho Melo (1699 – 1782), em 1758, por decreto, oficializou obrigatória a Língua Portuguêsa nas colônias). Proibiu o Nhengatu. 
No português que é falado nas unidades da Federação ou cidade ou núcleo habitacional surgem as línguas especiais de profissionais e as gírias, alem dos dialetos. Cada dia a língua brasileira e a portuguesa, foneticamente vão se diversificando. Claro que um idioma une um povo, mas as variações podem ser consideráveis e justificadas de acordo com a comunidade na qual se manifesta. 
As variações acontecem porque o princípio fundamental da língua é a comunicação oral, então é compreensível que seus falantes façam rearranjos de acordo com suas necessidades comunicativas, porque são os verdadeiros donos da língua. Os diferentes falares devem ser considerados como variações, e não como erros. Se se tratarem como erro estas variações, incorre-se no preconceito lingüístico, associado ao status das pessoas. O português falado em algumas cidades do interior do Brasil pode ganhar estigma pejorativo de incorreto ou inculto, mas, na verdade, essas diferenças enriquecem esse patrimônio cultural, que é a própria língua portuguesa 

Samba do Arnesto
Adoniran Barbosa 

O Arnesto nos convidou pra um samba, ele mora no Brás
Nós fumos não encontremos ninguém
Nós voltermos com uma baita de uma reiva
Da outra vez nós num vai mais
Nós não semos tatu!
No outro dia encontremo com o Arnesto
Que pediu desculpas mais nós não aceitemos
Isso não se faz, Arnesto, nós não se importa
Mas você devia ter ponhado um recado na porta
Um recado assim ói: "Ói, turma, num deu pra esperá
Aduvido que isso, num faz mar, num tem importância,
Assinado em cruz porque não sei escrever. 

Há, na letra da música, um exemplo interessante sobre a variação linguística. E se cada pessoa decidisse escrever como fala? Um novo idioma seria inventado, alterando a gramática e todo o sistema linguístico, determinado pelas regras, que cairiam por terra. Mas a fonética tem pouca ação dentro das gramáticas normativas da língua. Contudo, o que o compositor Adoniran Barbosa fez pode ser chamado de “licença poética”, já que ele transportou para a modalidade escrita a variação linguística presente na modalidade oral. As variações linguísticas acontecem porque são livres e vivas, crescem e florescem. O meio sociocultural fala mais alto. A gramática faz vistas grossas. 

Moda da Pinga 
Inezita Barroso 

Co'a marvada pinga é que eu me atrapaio / Eu entro na venda e já dô meu taio 
Pego no copo e dali num saio / Ali mesmo eu bebo, ali mesmo eu caio 
Só pra carregá é queu dô trabaio, oi lá! 
Venho da cidade, já venho cantando / Trago um garrafão que venho chupando 
Venho pros caminho, venho trupicando /Chifrando os barranco, venho cambeteando 
E no lugar que eu caio já fico roncando, oi lá! 
O marido me disse, ele me falô / Largue de bebê, peço pro favor 
Prosa de home nunca dei valor / Bebo com o sor quente pra esfriá o calô 
Se bebo de noite é pra fazer suadô, oi lá! 
Cada vez que eu caio, caio deferente / Meaço pra trás e caio pra frente 
Caio devagar, caio de repente / Vou de currupio, vou deretamente 
Mas sendo de pinga eu caio contente, oi lá! 
Pego o garrafão é já balanceio / Que é pra mode vê se tá mesmo cheio 
Num bebo de vez por que acho feio / No primeiro gorpe chego inté no meio 
No segundo trago é que eu desvazeio, oi lá! 
Eu bebo da pinga porque gosto dela / Eu bebo da branca, bebo da amarela
Bebo no copo, bebo na tigela / Bebo temperada com cravo e canela 
Seja quarqué tempo vai pinga na goela, oi lá! 
Eu fui numa festa no rio Tietê / Eu lá fui chegando no amanhecê 
Já me deram pinga pra mim bebê / Já me deram pinga pra mim bebê, tava sem fervê, oi lá! 
Eu bebi demais e fiquei mamada / Eu caí no chão e fiquei deitada 
Aí eu fui pra casa de braço dado / Ai de braço dado é com dois sordado 
Ai, muito obrigado! 


A moda da mula preta
Luiz Gonzaga 

Eu tenho uma preta com sete palmo de altura 
A mula é descanelada / Tem uma linda figura, ai, ai, ai 
Tira fogo na calçada / No rampão da ferradura, ai, ai, ai
Com uma morena delicada / Na garupa faz figura, ai, ai, ai
A mula fica enjoada / Pisa só de ancadura (bis) 
O ensino da criação / Veja quanto que regula, ai, ai, ai,
O defeito do mulão / Eu sei que ninguém calcula, ai, ai, ai,
Moça feia e marmajão / Na garupa, a mula pula, ai, ai, ai, 
Eu fui passear na cidade / Só numa volta que eu dei, ai, ai, ai,
A mula deixou saudade / No lugar onde passei, ai, ai, ai, 
Pro mulão de qualidade / Quatro conto eu injeitei, ai, ai, ai,
Pra dizer mesmo a verdade / Nem sastifação eu dei, ai, ai. 
Fui dizendo boa tarde, pra minha casa voltei/ ai,ai,ai

Assim, as divergências regionais campeiam. Chega-se a pensar que há um outro idioma parecido com a língua portuguesa falada em Portugal. Mesmo a língua culta, falada no Brasil, tem suas características muito acentuadas. Hoje pode-se dizer que, foneticamente, há grandes diferenças entre Brasil e Portugal. Daí, para onde vai essa diversidade fonética da língua portuguesa? A população de Portugal, em 2019, é de 10.190.160 habitantes. O Brasil conta com vinte vezes mais a população de Portugal. 



Referências 
Boone,David R. Sua voz está traindo você.Ed. Artes médicas sul ltda.Porto Alegre, RS, 1991. 
MEDEIROS, Adelardo.  A Língua Portuguesa. Disponível em: http://www.linguaportuguesa.ufrn.br/pt
Rocha Lima. Gramática normativa na Língua Portuguesa. Briguiet & Cia. Editores, RJ 1957.
Said Ali – Gramática Histórica da Lingua Portuguesa.
Serafim da silva Neto, Fontes do Latim vulgar

Um comentário:

  1. cada região tem um sotaque diferente, as x não entendemos, o mineires, o caipira, nordestino, sulista cada um com o regionalismo que deixa a lingua falada bela com suas particularidades

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