terça-feira, 31 de julho de 2012

SANTOS - DUMONT - ENTREVISTA VIRTUAL


QUEM DEU ASAS AO HOMEM – O PAI DA AVIAÇÃO

Autor: Rogério de Alvarenga

APRESENTAÇÃO
O homem inventou a alavanca, mas esperou cem ou duzentos anos para que as pessoas se acostumassem com ela, antes de inventar a roda. Descobriu como montar a cavalo, mas levou centenas de anos para inventar o arreio! Então, um dos sonhos mais fantásticos do homem era o famoso conto árabe do “tapete voador”! Compare, entretanto, esse tapete voador ao conforto e utilidade do “jato moderno”! Quem, em juízo perfeito, gostaria de sentar-se, em pleno vento e chuva, com granizo batendo no rosto, sem aeromoça, sem refeições quentes? Isso parece um sonho distante, um sonho de algum retardado, com imaginação retrógrada. O jato atual excedeu os sonhos do homem. E imaginar que em 1906, no dia 23 de outubro, Santos-Dumont, com 33 anos de idade, mineiro, brasileiro, ousou desafiar as leis invisíveis da natureza e elevar do solo um objeto mais pesado que o ar, transportando um ser humano. Era impossível e ele foi lá e fez. Elevou-se ao ar com o seu aeroplano SD. nº 14-BIS, sob o registro oficial do Aeroclube da França, aplaudido pela multidão que  assistia a essa façanha e cumprimentado oficialmente pelo mundo inteiro. Era tempo de euforia e a humanidade jamais pôde esquecer esse dia. Daí pra frente, nada seria como antes! Em 1901, no dia 19 de outubro, ele já tinha vencido o prêmio DEUTSCH, ao transpor a Torre Eiffel com o seu balão dirigível SD nº 6. Sempre, em tentativas anteriores, arriscou a sua vida e seus recursos financeiros em sucessivos fracassos. Fracassos magníficos, como sempre disse. E foi em frente, porque seu destino tinha hora marcada de chegar. Santos-Dumont usou recursos financeiros  próprios para todas as suas experiências em aerostação – não havia aeronáutica, ainda. Nem governo francês, nem brasileiro despendeu um centavo sequer. Tudo lhe foi dado pelo seu pai, Henrique Dumont, filho de franceses, radicados em Diamantina, estado de Minas Gerais, desde o início do século XIX.

Aqui estão as suas palavras, como se ele próprio estivesse ainda presente entre nós. 
Entrevistador
No ano de 2006, levanta voo de novo, nas praças do mundo, em reverência ao construtor das asas do ser humano! No campo de Bagatelle, em Paris, justamente no dia 23 de outubro de 1906, o mais pesado que o ar começou a voar! Primeiro centenário! Um desejo incontido da humanidade, desde o seu alvorecer, estava agora disponível ao mundo, abrindo as fronteiras, por ares nunca dantes voados! Boa noite, senhor Alberto Santos-Dumont!
Alberto Santos-Dumont
Boa noite! Revejo, com a leveza de um balão que sobe aos céus, o meu itinerário de trabalho e de esforço. Todos anseiam elevar-se aos ares, sem as correntes invisíveis da força da gravidade, uma sentença imposta pelos deuses aos seres humanos!
Entrevistador
Mas uma vida dedicada exclusivamente à busca do domínio do espaço, do vasto e imenso espaço visualizado, mas nunca dominado. Dominar o espaço!
SD
Sim! A minha vida inteira foi uma obsessão sem limites de dominar o espaço, como uma terrível força impulsora que tomava todo o meu ser, impregnava o meu inconsciente e me arrastava inexoravelmente para um desafio que já tinha subjugado até os próprios deuses do Olimpo. Um desafio petulante de minha parte! Podem hoje imaginar! Um desejo quixotesco e arrogante, mas alguém teria que ousar. Foi o meu esporte, de vitória em vitória. Vitórias seguidas, até mesmo nos desacertos. Nunca fracassei.
Entrevistador
A humanidade jamais esquecerá esse dia memorável, quando um aparelho mais pesado do que o ar, elevou-se do solo. Por toda a eternidade, enquanto houver criatura humana na terra, para historiar a distância e a velocidade dos voos, será forçoso, absolutamente inevitável começar pela resenha oficial de dois recordes batidos no relvado de Bagatelle, em Paris. Por aqueles dois recordes de Santos-Dumont!
SD
Realmente foram momentos admiráveis e meu entusiasmo era, a cada dia, reforçado pela montagem de novos modelos inventados. Aperfeiçoados e corrigidos! Minha aprendizagem foi construída, passo a passo, pelas imperfeições dos modelos anteriores. Sempre observando os erros e os acertos.
E
Tudo rompe a barreira da imaginação... A minha curiosidade não tem limites, também. Desta forma, gostaria de ter informações sobre a sua vida e sobre o seu trabalho. 
SD
Jamais neguei a alguém qualquer fato do meu trabalho ou da minha vida pessoal. Sempre estou disponível. Nunca fiz mistérios. Nunca tirei proveito pessoal das minhas ideias e dos meus inventos. Nem do que criei ou do que fiz. Trabalhei por idealismo civilizador puro. No trabalho, pus o máximo de inteligência, o máximo de tempo e o máximo de recursos financeiros próprios. Doei tudo, depois, para a humanidade. Todos os meus planos, meus estudos e meus projetos. Publiquei tudo. Divulguei tudo sem solicitar patente para coisa nenhuma. Deixei plena liberdade a toda gente, na continuidade do desenvolvimento da aviação. Nada ocultei a ninguém, por egoísmo injustificável. Os prêmios em dinheiro que recebi, distribuí com os mecânicos, meus auxiliares e com os pobres de Paris. Autorizei resgatar todas as cautelas de instrumentos ou ferramentas de trabalho, empenhados pelos operários, nos bancos de Paris. Portanto, estou agora, mais do que nunca, disponível para informar sobre todos os momentos de minha vida na face da terra.
E
Queria saber tudo sobre esta personalidade-mito que domina o imaginário da vida brasileira!
SD
Com o coração aberto, ponho-me diante da nação brasileira, para um debate franco e cordial.
E
Com o coração aberto! Onde está seu coração?
SD
Sempre esteve comigo, em vida. Após a minha morte, ocorrida em 23 de julho de 1932, o médico Walter Harberfeld, após o embalsamamento do meu corpo, retirou o meu coração e, mais tarde foi colocado em exposição. Meu corpo foi transladado para o Rio de Janeiro em 17 de dezembro desse mesmo ano, e sepultado no cemitério São João Batista.
E
Sim! Mas onde está seu coração?
SD
Encontra-se incrustado numa esfera de cristal e lâminas de ouro, sobre um pedestal de jacarandá, com uma estatueta de bronze de Ícaro, com os braços erguidos. Foi entregue ao primeiro Ministro da Aeronáutica do Brasil, Joaquim Salgado Filho, em 1944, por ocasião da SEMANA DA ASA, pelo presidente da PANAIR DO BRASIL, Paulo Sampaio. Depois, à Escola de Aviação do Campo dos Afonsos, no Rio de Janeiro. Entretanto, devo acrescentar que meu coração encontra-se verdadeiramente pairando sobre o meu estado de Minas Gerais, sobre o meu país, sobre a França e, afinal, sobre todos os recantos do mundo inteiro, em voos cada vez mais audaciosos. 
E
O senhor disse estado de Minas Gerais?
SD
Sou mineiro, nascido a 20 de julho de 1873, no mesmo dia que meu pai completava 41 anos de idade.  Nasci na cidade de Palmira e, em minha homenagem mudou seu nome para Santos Dumont, num sítio a 18 quilômetros da cidade, denominado, Cabangu. Hoje, essa casa me pertence por doação, feita em 1919. Fiz uma inscrição na porta: “Recebi por doação a casa onde nasci, Cabangu, oferecida pelo Congresso Nacional, como prêmio pelos meus trabalhos. Santos-Dumont. Obrigado”.
E
Considera-se mineiro, portanto!
SD
Meu pai é mineiro. Henrique Dumont, nascido em Diamantina, no ano de 1832. Era filho de franceses: François Dumont e Eufrásia Honnorée Dumont, que era filha de ricos ourives em Bordeaux. Vieram para o Brasil em princípios do século XIX e se estabeleceram em Diamantina, estado de Minas Gerais. Dedicaram-se à mineração de diamantes.
E
E pelo lado materno?
SD
Pelo lado materno, eu descendo de portugueses. Meu bisavô era médico da Corte Portuguesa, Joaquim dos Santos. Veio para o Brasil na época de D.João VI. Um dos filhos do Dr. Joaquim dos Santos, Francisco de Paula Santos radicou-se em Ouro Preto, capital do estado, casando-se com Rosalina, que era ouro-pretana.
E
Quer dizer que seu pai, Henrique Dumont, natural de Diamantina, casou-se com Francisca, a filha de Francisco de Paula Santos, uma ouro-pretana?
SD
Assim foi. Casaram-se Henrique Dumont e Francisca de Paula Santos na freguesia do Pilar, em Ouro Preto, no dia 6 de setembro do ano de 1856. 
E
Santos! Esta a origem de seu nome brasileiro, portanto!
SD
Sim, Dumont pelo lado paterno e Santos pelo lado materno. Sempre fiz questão de que meu nome fosse constituído de partes brasileiras e francesas: Santos-Dumont, que os franceses diziam: “Sontôs-Dimon”.
E
Quantos irmãos?
SD
Meus pais tiveram oito filhos, três homens e cinco mulheres. Eu era o sexto filho do casal. Todos nasceram no estado de Minas Gerais, com exceção das filhas Sofia e Francisca que nasceram em Valença. Uma curiosidade: três das minhas irmãs casaram-se com três irmãos. Maria Rosalina, casou-se com Eduardo Villares. Virgínia, com Guilherme Villares e Gabriela, com Carlos Villares. 
E
Seu pai era engenheiro?
SD
Meu pai estudou em Paris na École Central des Arts e Métiers, obtendo o diploma de engenheiro, em 1853. Ao regressar ao Brasil tornou-se empreiteiro de obras públicas em Ouro Preto. Trabalhou depois na Estada de Ferro D.Pedro II, Central do Brasil. Construiu a ponte da Estrada de Ferro Central do Brasil, sobre o rio das Velhas, em Sabará.  Depois, esteve na Mantiqueira, onde moraram e em Valença, no Rio de Janeiro. Ainda, nessa época, teve uma experiência num projeto de mineração em Jaguará, perto de Santa Luzia, MG e ainda uma experiência no campo da agricultura, nessa região.
E
E o Rei do Café?
SD
Meu pai, em 1879, adquiriu um vasto terreno em São Paulo, na região de Ribeirão Preto e transformou-o numa das maiores fazendas produtoras de café do Brasil. Tinha trezentos contos de reis e oitenta escravos. Posteriormente admitiu trabalhadores estrangeiros, imigrantes, com formação em mecânica. Plantou milhares de pés de café. Transformou também a propriedade num empreendimento comercial de alta rentabilidade. Como era engenheiro, com a experiência adquirida no estado de Minas Gerais, chegou a construir estradas de ferro dentro da propriedade, para facilitar o escoamento da produção. A essa propriedade deu o nome de Arindeúva.
E
Quer dizer que sua família passou a residir nessa fazenda Arindeúva?
SD
Meu pai dedicou-se totalmente ao novo empreendimento e transferiu toda a família para lá. Ali, também, fomos muito felizes e meu pai conseguiu ganhar muito dinheiro com esforço, trabalho e inteligência. Ali vivemos de 1879 até 1891. Foram, portanto, 12 anos de trabalho e dedicação de meu pai.
E
1891?
SD
Nesse ano, meu pai vendeu a sua empresa “DUMONT COFFEE COMPANY”, para intermediários de uma empresa inglesa. Doze mil contos de réis! Os ingleses pagaram alto preço. Uma soma de dinheiro fabulosa.
E
Por que seu pai desfez dessa propriedade?
SD
Antes de tudo, foi uma questão de oportunidade comercial. Em segundo plano, meu pai teve um acidente com uma charrete e ficou hemiplégico, incapaz de acompanhar todos os serviços da lavoura. Ele era objetivo e tinha espírito de um cidadão preparado para o século XX que se aproximava. Não era um perdulário, mas não prendia sua fortuna entre as suas próprias mãos. Repartiu com os filhos, com a alegria de ter deixado para sua descendência uma vida financeira assegurada. Cumpriu seu destino. Meu pai me transmitiu isso. Nunca tranquei minhas economias em cofre de chave perdida.     
E
Mas em Arindeúva viveu um bom período de sua juventude!
SD
Nessa fazenda, considerando-se as precariedades da época, fui feliz e pude levantar os meus primeiros voos, principalmente os imaginários. Ali, fui alfabetizado pela minha irmã Virgínia, pois não havia escola pública oficial. Com isso, iniciei a leitura das obras de Júlio Verne e viajei com ele, em suas naves e em seus submarinos. Li “Cinco semanas em um balão”, “Da terra à lua”, “Vinte mil léguas submarinas”. Tinha tranquilidade para isso.
E
Além das leituras, gostava de lidar com as máquinas da fazenda!
SD
Gostava realmente de mexer com as máquinas. Meu pai notou logo minha tendência para a mecânica e me incentivou sempre. Permitiu até que eu dirigisse locomotivas na fazenda. Estudava matemática e mecânica. Tive muitos professores, inclusive estrangeiros. Não tinha ainda definido o meu futuro profissional.
E
Ficou em várias escolas?
SD
É verdade! Estudei em São Paulo, em Campinas e no Rio de Janeiro. Meu pai chegou a me matricular na Escola de Minas de Ouro Preto.  Lá fiquei dois anos sem muito interesse em estudar. Nunca fui um aluno prodígio, mas sempre acatava as decisões do meu pai.
E
Não se adaptava aos regimes escolares?
SD
Talvez, sim. Todos vinham com uma sabedoria já pronta. Eu queria ir além, procurar por meus próprios meios e avançar além das teorias conhecidas.
E
Quando sentiu o primeiro balão?
SD
Ancorado no meu pensamento ficou o balão que vi numa feira em São Paulo, no ano de 1888. Era um balão esférico, cativo, isto é, preso à terra por uma corda. Havia um balonista profissional, artista de circo que fazia acrobacias maravilhosas que me encantaram. Ele era esperto e fazia tudo por dinheiro. Elevava-se aos ares numa barquinha suspensa a seu balão de gás. Anunciava que desceria de paraquedas, coisa que nem existia na época. A barquinha descia puxada pela corda. Tudo me fascinava. Minhas retinas registraram esse acontecimento e ainda hoje o vejo claramente rememorado.
E
Depois, Paris!
SD
Meu pai levou toda a família a Paris, para conhecer os parentes e amigos franceses. Depois, ver as novidades da cidade maravilhosa, com iluminação elétrica. A capital do mundo civilizado! Talvez eu passasse a estudar em Paris. Também vi um balão que me atraiu de modo arrebatador. Não o tirei do meu pensamento. Queria entrar e subir nesse balão, que por ele toda Paris encontrava-se enfurecida de prazer. Peguei o ANNUAIRE BOTIN e encontrei o endereço do balonista. Queria fazer a minha primeira viagem ao espaço num balão. Mas o balonista pediu-me um mil e duzentos francos, com tantas exigências de responsabilidades de danos contra terceiros, bem como outras despesas asseguradas em documento devidamente assinado e registrado. Pensei muito e acabei desistindo. Desisti naquela oportunidade. Não desisti do meu intento. Resolvi então comprar um carro de estrada. Um PEUGEOT de 3,5 cavalos. Tornei-me automobilista. Um motor a gasolina. Não havia necessidade de tirar documento de autorização para dirigir automóveis. Quando voltei para o Brasil, trouxe esse carro comigo.
E
E sua emancipação?
SD
Mais tarde, meu pai me levou ao tabelião e assinou a minha emancipação aos dezoito anos de idade, isto é, em 1891 e me deu centenas de milhares de réis. Disse-me: “prefiro que não se faça doutor! O futuro do mundo está na mecânica. Não precisa ganhar a vida, pois eu lhe deixarei o necessário para viver!”  
E
Voltou para Paris?
SD
Tão logo que pude. Em 1897, fiz a minha mudança. Comprei outro carro de estrada Peugeot e fui procurar os balonistas famosos que dominavam os ares, na época, M. Lachambre e seu sobrinho Machuron.
E
Nessa época, já tinha um projeto em mente?
SD
Mais do que nunca já tinha um objetivo firmado. Além disso, tinha pressa. Não podia esperar. Uma avidez sem limites. Tinha dinheiro suficiente. Comecei a estudar mecânica e fui em frente.
E
E os senhores Lachambre e Machuron?
SD
Eles me receberam muito bem. Fui claro! Quero voar com vocês nesse balão. Quanto custa? Eles me disseram que eram duzentos e cinqüenta francos, apenas. Achei barato em vista do anterior que me pediu um mil e duzentos francos e mais as responsabilidades de danos. Perguntei pelos danos? E eles me responderam que não haveria danos e que só subiam na certeza de bom desempenho e com total segurança. Senti firmeza! Paguei na hora, e marcamos o dia da ascensão. Não aguentava esperar mais.
E
Era uma ascensão com segurança total?
SD
Isso me foi garantido. Era um balão esférico, com uma barquinha a bordo. Balão livre, sem motor, ao sabor dos ventos. Cheguei cedo ao local da ascensão. Não aguentava esperar. Subi com o piloto, senhor Machuron. Subimos mil e quinhentos metros. Depois três mil. Eu estava eufórico, sem medo, admirando a paisagem do alto e vendo as pessoas como formigas na terra. Três horas depois, abri a minha caixa de lanches e fizemos o primeiro piquenique em balão do mundo. Eu e o meu já amigo, senhor Machuron. Descemos numa área rural. Depois ficamos sabendo que estávamos a cem quilômetros do ponto de partida. Pegamos o trem para retornar à base. Machuron fez questão de pagar a passagem que já estava incluída no contrato. Foi um momento marcante na minha vida. Senti que tinha um destino a cumprir e não podia esperar.
E
E depois?
SD
Fiz observações sobre o modelo do balão, perguntei tudo e tirei conclusões. Fui logo falando para o senhor Lachambre que queria encomendar um balão para mim.  Muita pretensão da minha parte, mas eu queria um balão com algumas características especiais, de cem metros cúbicos, apenas, e a barquinha como pêndulo. Desenhei o balão. Esférico, construído com seda japonesa, muito fina e leve. Além de tudo, resistente. O senhor Lachambre achou perigoso tal empreendimento, mas no final, concordou comigo. Seu custo: US $30.000.
E
E assim foi feito?
SD
Assim foi feito. Era como se a primeira ideia aeronáutica propriamente dita, estivesse na iminência de nascer. Pressentia isso. E era isso mesmo que acontecia. Tinha dinheiro para esse fim. Era meu destino! E tinha que se cumprir.
E
Assim nasceu o balão SD nº 1?
SD
Assim nasceu o balão SD número 1. Era o Santos-Dumont número um. Dei-lhe o nome de BRASIL e ficou concluído no dia 4 de julho de 1898. Era a maior experiência no campo da aerostação. – Não havia aeronáutica, ainda. Era um balão esférico, desenhado por mim, pequeno, que poderia ser levado pelo vento com facilidade. Era perigoso, como disse o senhor Lachambre.  Com ele subi pilotando sozinho. Aprendi comigo mesmo, pelos ares, com a própria experiência. Foi um momento maravilhoso, mas cheio de pequenos fracassos, também maravilhosos porque foram recolhidos com paciência e sabedoria. Já pensava num balão oblongo, em forma de charuto, acionado por motor e puxado por hélice. Era dirigir no espaço! Um balão dirigível!  No ar, por sobre a cabeça dos parisienses, fui visto pela humanidade. Entrei para o meio dos famosos. Passaram a citar o meu nome em todos os acontecimentos de aerostação.
E
Alguns problemas?
SD
Muitos problemas. Ocorriam imprevistos que eu mesmo tinha que dar solução imediata ou me perder pelo espaço. Uma descida muito longe do ponto de partida. Um comportamento inesperado do balão, em grande altura sem motivo aparente. Uma surpresa pela noite que descia antes do balão, dificultando a aterrissagem. Tudo concorria para aperfeiçoar a técnica de pilotagem balonística e me dar segurança e confiança nas iniciativas. Além disso, para me projetar no vasto cenário do interesse do público dessa maior metrópole cultural do ocidente.
E
O SD nº 1 lhe trouxe fama e prestígio?
SD
Tive a popularidade de um aeróstata. Minhas relações sociais se avolumaram e Paris me conhecia. Mas eu queria avançar nas minhas experiências, seguir eliminando erros e avançando nas técnicas para construir novos balões. .
E
Consta que o senhor era conhecido e admirado nos salões, nos cafés, nos jardins, onde quer que o senhor estivesse, com amigos, conhecidos e com admiradores anônimos. Era interrogado pelos curiosos. Era o “petit Santos!”
SD
Mas o SD nº 1 – o balão Brasil, assinalou o começo de uma lista impressionante de fracassos, por assim dizer, magníficos. Tive que modificar toda a sua estrutura. Por isso, fiz muitas modificações. Nada era definitivo, precisava aproveitar os resultados. Nada de ficar estático sobre essa pequena popularidade. Avançar! Nem dormia direito e estava sempre exaltado, forçando o trabalho dos mecânicos e desenhando novos modelos de balões. Meu sonho era dirigir no espaço, construir um balão dirigível, era o meu objetivo. Era o primeiro dirigível! Em 18 de setembro de 1898, com o invólucro alongado, o dirigível nº 1 já possuía todos os elementos que iriam garantir o sucesso das outras aeronaves. Houve um acidente na primeira tentativa de vôo. Fui salvo por um grupo de crianças que brincavam por ali. Pedi para puxarem a corda, a fim de evitar a queda do piloto. Foi a salvação. Depois, com humor, fiz o comentário: “subi em balão e desci em papagaio.”
E
E que fim teve esse balão Brasil, SD nº 1?
SD
Depois de duas ou três ascensões, ele dobrou-se e encerrou a sua curta história. Dobrou o balão, não o balonista.
E
O senhor construiu outros balões do mesmo tipo?
SD
Projetei o SD nº 2. Meu relacionamento profissional com os senhor Lachambre e seu sobrinho Machuron passou a se tornar cada vez mais íntimo. Obtive a confiança deles e já pilotava sozinho qualquer balão. Afinal, trabalhávamos juntos com o mesmo objetivo. Eles, entretanto, não tinham a ambição que dominava o meu ser por completo. Minha vida passou a ser planos, oficinas, operários, forja, bigorna. Eu trabalhava com o objetivo de conseguir a dirigibilidade dos balões. Não pensava em triunfo apenas. Queria demonstrar a minha capacidade de criar formas para dominar o espaço.  

E
Mas e o SD nº 2?
SD
Este foi de encontro às árvores dos Jardins da Aclimação de Paris. Mas parti para o SD nº 3, modelo 1999. Fiz evoluções perfeitamente dirigidas, e passei a voar com frequência sobre os telhados de Paris. Mas, um dia, desgovernado, devido à perda de um leme de direção, fui descer em péssimas condições na planície de Ivry. Passei a projetar o SD nº 4, que voou em presença dos membros do Congresso Aeronáutico Internacional e também do cientista norte-americano professor Samuel Pierpoit Langley, membro desse Congresso. Dele recebi “o mais cordial encorajamento”. Mas, a estrutura foi modificada. Tinha hélice de proa, acionada por um motor Buchet de 7 cv e um balão de hidrogênio de 420 m3 de gás. Era o SD nº 4, dirigível, portando um selim para o piloto. Foi um sucesso. Meus balões eram cilíndricos. As rodas eram usadas apenas para sair do hangar.
E
O que era o hangar?
SD
Um grande galpão para recolher as aeronaves e servir de oficina. Além disso, era nosso ponto de encontro com as personalidades interessadas nos nossos balões. Foi também uma criação da época.
E
Finalmente o SD nº 5?
SD
Não finalmente, mas em continuidade. Com ele, em caráter não-oficial, contornei a Torre Eiffel. Era capaz de voar com controle e velocidade. Entretanto, um dia, esse balão foi bater na quina da platibanda de um prédio, nos Jardins do Trocadero, em Paris e explodiu como um saco de papel cheio de vento e esmagado com grande força. Esse balão SD nº 5 era dirigível e o que mais perto chegou do triunfo, ao conduzir um aeronauta. Não foi uma glória perfeita e desejada, mas me levou bem perto da morte; Não tive nem um arranhão.
E
Passou imediatamente para o SD nº 6?
SD
Não imediatamente. Procurei armazenar novas energias. Precisava atacar em outros flancos. Pela manhã, jogava tênis, fazia excursões de automóvel, preparava cálculos, visitava oficinas, dava instruções a operários e mecânicos. Mecânicos especializados em motores. Também, costureiras. De tarde, trabalhava na forja, sem paletó. Mas estava com o espírito sempre na frente da realidade. Nesse tempo, não repousava e quase não dormia. À noite, saía e visitava amigos, ia a teatros e frequentava a vida social de Paris. Sempre gostei de teatro e de concertos. Tenho aversão a jogos, a bebida e tabaco. Meu esporte é o tênis. Mas logo depois, me chegava a ideia de que tinha uma data marcada para um encontro maravilhoso, mas eu próprio não imaginava onde seria. Sabia que deveria ser no campo da dirigibilidade e da aerostação. Sentia a ânsia da conquista e o gosto da aventura. Investi somas fabulosas de dinheiro nesse negócio e não poderia perder. Todas as despesas saíam do meu bolso, sem pedir ajuda a governos. Esbanjamento de inteligência e de finanças. Ainda que custasse toda a minha reserva financeira! Ainda que me custasse a vida! Era como se tivesse que carregar sobre os meus ombros a tremenda e pesada responsabilidade de milhares de anos do sonho impossível do gênero humano. Era impossível, mas eu precisava realizar!   
E
Finalmente, o SD nº 6?
SD
Não finalmente, mas em continuidade. Era o encontro com o destino, tanto meu como da própria humanidade. Ocorreu na tarde do dia 19 de outubro de 1901.   O meu SD nº 6 foi construído em 22 dias, tendo sido testado várias vezes para ganhar o prêmio “DEUTSCH”, ao fazer o contorno da Torre Eiffel e retornando à base de onde tinha partido. Esse balão tinha 33 metros de comprimento e seis metros de largura. Nesse dia, partindo de Saint Cloud, às 14h42, conquistei o Prêmio Deutsch, oferecido pelo patrocinador Deutsch de la Meurthe, magnata do petróleo, meu amigo e admirador. Ele era, ainda, um dos maiores incentivadores da aviação. Houve aplausos da multidão que assistia ao evento. Enquanto os membros do Aeroclube discutiam, a multidão aplaudia, sabendo que, a partir daquele momento, a humanidade seria diferente para sempre. Conquistei um prêmio de 100.000 francos! Era o maior desafio da aeronáutica, no primeiro ano do século, ao decolar de Saint Cloud, contornar a Torre Eiffel e voltar em menos de trinta minutos!
E
Ao terminar a prova, sua emoção era grande!
SD
Será que ganhei? Foi o que disse. Logo me disseram que sim. Esse fato repercutiu no universo inteiro, como um empreendimento humano contra as leis então conhecidas e ainda não dominadas da natureza. Vasta repercussão na face da terra. O homem poderia erguer-se aos ares e comandar os movimentos em todas as direções no espaço atmosférico! Com mais esse evento, acabei de conquistar a sociedade parisiense. Era o triunfo total!
E
E o prêmio?
SD
Reparti o prêmio inteiro que, com os juros, chegou a 125.000 francos, entre os meus auxiliares mecânicos, com os pobres de Paris. Resgatei todas as cautelas de ferramentas de trabalho empenhadas por trabalhadores franceses. Acompanhei de perto essa distribuição, sob a responsabilidade do chefe de Polícia de Paris, senhor Lépine.      

E
Já podia naturalizar-se francês?
SD
Nunca me fizeram essa proposta porque sabiam da força das minhas convicções brasileiras, arraigadas no meu sangue e na minha têmpera. Mas, seria também uma honra, porque sempre admirei a França, Paris e, sobretudo, o povo francês. Como disse antes, nunca precisei de auxílio financeiro do governo francês ou do brasileiro.
E
O povo francês passou a admirá-lo com muito carinho!
SD
É verdade. Havia coisas estranhas. Os parisienses me admiravam. Por isso, procuravam se modelar em mim. Como eu passasse a aumentar o tamanho do salto de meu sapato, pois eu tenho apenas 1,52 m de altura, o povo me copiou e passou a ser moda, aumentar a altura dos sapatos masculinos. Também as roupas em listras verticais e a pentear os cabelos partidos ao meio. Também o colarinho alto das camisas. Ah! Também o chapéu abanado, amarfanhado, que usei uma vez, depois de apagar o fogo que irrompeu num balão. Quando desci, estava com o chapéu todo roto. Assim me fotografaram e assim saiu nos jornais do dia seguinte. Dias depois, a população parisiense usava o chapéu, cuidadosamente, amarfanhado. Finalmente, passei a usar o meu relógio de algibeira amarrado ao pulso esquerdo para facilitar a consulta às horas. Foi um sucesso popular. Os empresários começaram então a fabricar relógios de pulso por minha causa. E a moda pegou. O precursor foi o empresário Louis Cartier, que, em 1908, iniciou a produção. Posteriormente, a firma Jalger, em 1911, lançou o modelo “Santos”!
E
E os novos admiradores?
SD
Eram inúmeros amigos que me apoiavam e tinham carinho especial por mim, pelo meu trabalho e pelas minhas ousadias no campo da aerostação. Dentre elas, não posso deixar de citar a Imperatriz Eugênia, Condessa d`Eu. Além disso, o senhor Alexandre Gustave Eiffel veio me cumprimentar pessoalmente. Ele era o engenheiro francês que construiu a Torre Eiffel, no campo de Marte, em Paris, por conta dos Estados Unidos que prestava homenagem à França, na Exposição Mundial de 1899. Minhas amigas, a artista Cleo de Mérode e a soprano Maria Barrientos. Não posso deixar de citar o amigo, senhor Lachambre e meu amigo e meu instrutor, o piloto Machuron. E tantos mais. Sei que estou fazendo uma grande injustiça, deixando de citar tantos amigos e admiradores.
E
Vamos prosseguir porque há muitas coisas ainda que precisamos saber. Depois das glórias, do prêmio e do domínio da dirigibilidade no ar, que aconteceu?
SD
Nada mais do que, no dia seguinte, iniciar o trabalho no meu hangar. Meus amigos mecânicos estavam eufóricos, mas disse a eles que haveria muita coisa, ainda, a comemorar. A humanidade nos esperava com o relógio no pulso esquerdo. Era hora de trabalho sem descanso.
E
E que destino teve o balão SD nº 6?
SD
Caiu no mar Mediterrâneo, num passeio que fiz, com alguma distração de minha parte. Descemos lentamente. No dia seguinte, foram resgatados o balão, a quilha e o motor.
E
Prosseguiu na construção de novos balões?
SD
Agora, mais do que nunca. Uma obsessão, uma doce obsessão me perseguia e me impulsionava. Estive nos Estados Unidos e em Londres. Retornei a Paris, tendo em vista construir um aeródromo. Esta foi a primeira estação de aeronaves. Na primavera de 1903, minha estação ficou pronta e eu possuía três aeronaves: o SD nº 7 o SD nº 9 e o SD nº 10.
E
E o SD nº 8?
SD
Saltei esse número por superstição. Alguns pensam que saltei o número sete.
E
E o SD nº 7?
SD
É o meu dirigível de corrida. Tem duas vezes a capacidade ascensional que o SD Nº 6, o premiado. Mas, o SD nº 10 foi chamado pelo pessoal de “ônibus”, Tinha a força para transportar quatro ou cinco pessoas. Grande provisão de combustível, para não falar em munição para a guerra.
E
E o SD nº 9?
SD
Esse foi o menor dos dirigíveis possíveis. Era prático e com ele voei durante várias semanas. Com ele, eu passeava em Paris, ia almoçar no Bois de Bologne, ou em minha casa na avenida Champs Elysées.
E
E Aída de Acosta?
SD
A grande amiga, Aída de Acosta, uma jovem cubana, foi a primeira mulher do mundo a pilotar sozinha um dirigível, em 29 de junho de 1903.
E
E a parada militar?
SD
Voei com o SD nº 9, em Paris,  sobre a parada militar que ocorria no dia 14 de julho de 1903, em comemoração ao centenário da tomada da Bastilha. Sobrevoei por Longchamps e quando passei pelo presidente da República, disparei 21 tiros para o ar com o meu revólver. Era uma excepcional circunstância essa da apresentação de uma aeronave a um exército, pela primeira vez.
E
E a bandeira do Brasil?
 SD
Estava tremulando sempre nos meus balões, junto com a bandeira da França, desde o SD nº 1, denominado Brasil. Mas, nesse dia da parada, depois de cumprimentado oficialmente pelo Governo, ofereci-o às autoridades francesas para que o usassem da maneira que quisessem, bem como todos os meus planos e projetos estariam à disposição, inclusive em caso de guerra, desde que não seja guerra contra países da América e, claro, contra o meu país, o Brasil..     
E
E como chegou aos aparelhos mais pesados que o ar?
SD
Construí primeiro o SD nº 14, um aeromóvel mais leve que o ar. Ele era um balão dirigível e eu já pensava em aeroplanos. Estava no auge dos meus experimentos. Daí, a minha experiência mais importante. Construir um aparelho mais pesado que o ar e colocá-lo acoplado a outro para conseguir altura e iniciar o voo. Mas, como comandar aviões? Quem poderia me ensinar? Nunca seria possível encontrar alguém. Tive que passar por etapas no processo de aprendizagem e domínio do espaço. Por isso, imaginei acoplar ao SD nº 14 ao novo modelo SD nº 14-Bis.
E
A ideia tinha nascido?
SD
Por três anos me envolvi na idéia de um aeromóvel no espaço. Estava envolvido pelas circunstâncias a dar prosseguimento ao meu trabalho. Sentia o peso da minha responsabilidade e da minha habilidade de chegar a um limite. Temia esse limite. Fui longe demais. Não podia desistir. Assim, me embarquei nessa ideia de colocar no espaço os modelos mais pesados que o ar. Um francês, obcecado pela aerostação, Clément Ader, já tinha inventado a palavra “avião”. Meu destino tinha que se cumprir. Fui à luta.
E
Construiu um aeroplano?
SD
Mesmo sem saber se voaria ou não. Como manobrar esse aeroplano, como disse antes? Quem me ensinaria? Por isso, construí primeiro o balão SD nº 14, para erguer-se no espaço carregando o SD nº 14-Bis. Os aeronautas morriam porque não sabiam, como ninguém no mundo sabia, como comandar esses aparelhos. Para evitar a morte em acidente, desenvolvi esse procedimento de acoplamento. Assim, fiz várias tentativas. Em 13 de setembro de 1906, consegui por instantes, permanecer 50 a 70 centímetros do chão.
E
Novas experiências?
SD
Em 23 de outubro, houve tempo maior. Um jornalista francês escreveu que tinha sido “um minuto memorável na história da navegação aérea.”
E
Finalmente, nesse dia 23 de outubro de 1906!
SD
Agora, concordo! Finalmente! Nesse dia, consegui os primeiros recordes da aviação do mundo. Voei, no tempo de vinte e um segundos e um quinto a distância de 220 metros. Tudo estava registrado e controlado oficialmente pela comissão especialmente constituída pelo Aeroclube da França, no campo de Bagatelle. Um jornal parisiense dizia: “É a primeira vez que um aeroplano com motor, carregando um homem, alça voo livremente.”
E
Por que concordou com aquele “finalmente?”
SD
Esse foi o meu segundo e o último encontro com o meu destino na aerostação: a glória. Estava batido o primeiro recorde de distância e de velocidade do mundo, em aeroplanos, isto é, em aparelho de voo mais pesado que o ar – e tudo sob o controle oficial do Aeroclube de França, que era, na época, a autoridade universalmente reconhecida para esse fim. Toda a França festejou o acontecimento, e o telégrafo recebeu mensagens do mundo inteiro. Estavam consagrados o dia 23 de outubro 1906 e o SD nº 14-Bis 
E
Mas ainda houve o “Demoiselle”!
SD
Foi o mais leve e o mais manobrável dos aeroplanos. Três anos de glória também para o Demoiselle. Voei por onde bem quis, pilotando-o . Gozei as delícias de ser dono de uma glória, então única na face da terra, imortalmente única na face da terra, imortalmente única para a humanidade.
E
E a repercussão desse recorde do SD nº 14-Bis?
SD
Um jornal francês da época publicou: “Por toda a eternidade, enquanto houver criatura na face da Terra, será inevitável, será forçoso relembrar aqueles dois recordes batidos no relvado de Bagatelle, por Santos-Dumont”.
E
Depois da glória, a riqueza?
SD
Nunca tirei proveito pessoal daquilo que inventei ou do que fiz. Trabalhei por idealismo, por missão. Empreguei meus recursos financeiros tanto quanto tinha. Ou se mais eu tivesse e precisasse. Dei tudo de presente para a humanidade. Não ocultei nada a ninguém. Publiquei tudo, divulguei tudo, sem registrar patente para coisa alguma. Os prêmios? Reparti todos com os meus amigos e companheiros. O caminho está aberto para o mundo dominar o espaço e chegar ao infinito. Não construí e nem desejo construir aeroplanos para venda. Tudo está à disposição de todos. Estão disponíveis todas as indicações para que se façam outros aparelhos mais aperfeiçoados. Meu grande e único desejo é o desenvolvimento da aviação.
E
E em continuidade?
SD
Em 1909, em ato irrecorrível, decidi afastar-me de tudo quanto fora de meu passado como atividade profissional. Não posso esquecer o meu passado. Um peso enorme. Agora, sinto-me incapaz de continuar. Estou cansado. Muito cansado!
E
Tem notícia dos acontecimentos mais recentes da aviação?
SD
Sei que em 1947, conseguiram, pela primeira vez, voar com a velocidade igual à do som. Sei que hoje, os aviões são capazes de transportar centenas de pessoas. Eu previ que o Aeroporto de Nova York seria o maior do mundo. Sempre tive isso em mente.
E
E a guerra de 1914 a 1918?
SD
É um capítulo indefinível na minha consciência e que me perturba e que me entristece. Foi uma guerra devastadora. Lamentei que a aviação tivesse sido arma de destruição. Não posso conceber isso. Depois dessa guerra, além das mortes e da destruição pelo lançamento de bombas, restaram pilotos desempregados. Em 1918, a França tinha 5.600 pilotos desempregados. A Inglaterra, 7.500 pilotos. A Alemanha, outros milhares de pilotos desempregados. Permaneci na Suíça, nessa época. Sei de tudo que se passou e retornei à minha pátria.
E
Em vez de bombas, hoje transportam cargas e passageiros. Há o correio aéreo e a aviação civil.
SD
Certamente é o que me conforta.
E
E, pela sua chegada ao Brasil houve grandes manifestações de carinho e consideração.
SD
Sim, apesar de ter havido tantos acidentes e eu ter perdido tantos amigos. Também me desfaço desses momentos cruciais da minha vida.
E
Passou a residir no Brasil?
SD
Adquiri um terreno na cidade de Petrópolis e lá construí a minha casa, com os requintes de conforto e originalidade que pude imaginar. Era a minha “Encantada”.
E
Foi agraciado com Medalha de Ouro?
SD
O presidente do Brasil, Campos Sales, concedeu-me essa honra. Além da Medalha de Ouro, recebi também o prêmio de 100.000$00 (cem mil réis) em dinheiro. Lembro-me também que muito me sensibilizou uma medalha em ouro de São Bento que recebi da Princesa Isabel, em 1903. São Bento me protegeu contra possíveis acidentes.
E
Eleito para a Academia Brasileira de Letras?
SD
Sim, fui eleito, na cadeira de Graça Aranha, em 1931. Na verdade, nunca ocupei essa cadeira. Foi uma honra e uma consideração muito grande.
E
E a Medalha Santos-Dumont?
SD
Foi instituída pelo Governo do Estado de Minas Gerais, em meu nome, tendo em vista o disposto na Lei nº 1.493 de 16 de outubro de 1.956, conferindo-a anualmente, na cidade mineira de Santos Dumont, em Cabangu, onde nasci, a personalidades que se destacam na vida pública nacional.   
E
Hoje, Marechal do Ar?
SD
Sim! Em 1956, o então presidente da República, doutor Juscelino Kubitschek de Oliveira enviou essa proposta ao Congresso Nacional, me concedendo esse posto honorífico. Foi aprovado em 23 de setembro de 1959, sob o título de Marechal do Ar da Força Aérea Brasileira. Não recebi esse título em vida, porque, no dia 23 de julho de 1932, achei por bem, deixar essa vida. Tive sofrimentos profundos com a Guerra Civil Brasileira de 1932, vendo irmãos destruírem irmãos brasileiros. A guerra não é solução para nada. Foi uma decisão, foi a melhor decisão para mim naquele momento. Se me permite, devo me retirar. Estou realmente muito cansado e triste. Meu mundo está em desespero também e eu me encontro sozinho dentro dele. Mais tempo tivera para voar e sentir-me pairando sobre todas as criaturas. Estou me afastando simplesmente por tristeza. Deixo para a humanidade tudo o que fiz e tudo que realizei. Sei que, depois dos meus inventos, tudo será diferente no mundo. Não posso dizer adeus, porque a minha morte será silenciosa e profundamente triste.
E
O senhor estava hospedado no Grande Hotel La Plage, em Guarujá, no apartamento  nº 152, não é verdade?
SD
É verdade. E o meu sobrinho Jorge Dumont Villares estava também hospedado nesse hotel, no apartamento nº 151. Mas ele não estava presente na hora da minha despedida.
E
E o seu sepultamento?
SD
Minha certidão de óbito ficou desaparecida por 23 anos e a “causa mortis” que consta nessa certidão é de “colapso cardíaco”. Meu corpo foi embalsamado e transladado para o Cemitério São João Batista no Rio de Janeiro e sepultado no dia 17 de dezembro de 1932. Nesse local, estavam sepultados meus pais. Em tempos anteriores, mandei erigir um monumento semelhante ao que me dedicaram na França, em Saint Cloud, com uma estátua de Ícaro, com os braços erguidos.  Mandei trazer os restos mortais de meus pais para aí. Agora, estamos juntos. Meu pai me compreendia e conhecia o que eu podia fazer pela humanidade. Ele me proporcionou todos os meios para que isso se concretizasse.  Meu pai tem a sua parcela de benemérito da humanidade. Henrique Dumont, mineiro de Diamantina. Brasileiro do mundo!
E
Suas palavras finais!
SD
Cumpri o meu destino. O que vale, senhores, viver e não interferir na vivência das pessoas? O que adianta passarmos por esta vida como uma flecha rápida e imperceptível? Assim passei pela vida. Deixei o que pude de mim. Entreguei tudo que tive para o bem da humanidade. É simplesmente o que pude fazer! O homem se faz homem na relação com o próximo. O alicerce nas relações é a confiança recíproca. E, às vezes, somos iludidos pela confiança, mas a desconfiança faz com que sejamos enganados por nós mesmos. Nada mais posso dizer, além disso!
E
Senhores! “Santos-Dumont era a própria generosidade, a elegância inata, a bondade e a retidão. Trabalhou visando unicamente o bem da humanidade, com intensa obsessão. Sem ele, tudo teria sido diferente neste mundo. Deixou como herança, também, o seu nome gravado nos corações das gerações vindouras. Os que compreendem os benefícios que ele prestou ao desenvolvimento da humanidade hão de reverenciá-lo eternamente, com carinho e gratidão.  


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BARBOSA, Waldemar de Almeida. O centenário de Santos Dumont. Belo Horizonte: Suplemento pedagógico especial nº 10, Minas Gerais, 1973.  
BARROS, Henrique Lins de. Santos Dumont e a invenção do voo. Rio de Janeiro: Jorge Zahar editor, 2003.
MOURÃO, Paulo Kruger Correa. Santos Dumont em Minas Gerais, Belo Horizonte: Suplemento pedagógico especial nº 10, Minas Gerais, Belo Horizonte, 1973.
LAGAZ, Guto. O gênio fértil de nosso maior designer, São Paulo: Revista  Caros amigos – suplemento, ano X, n.28, julho, 2006.
PIMENTA, Demerval José. Santos-Dumont e Minas Gerais, Belo Horizonte: revista do Instituto Histórico e Geográfico de MG, n. XVII, 1963.
SANTOS-DUMONT, Alberto. Os meus balões, tradução e adaptação de A de Miranda Bastos. Rio de Janeiro: editora Brasil-América, Grandes figuras, nº 20, em quadrinhos, 1971
VILLARES, Henrique Dumont. Quem deu asas ao homem.Rio de Janeiro: MEC – Instituto Nacional do Livro,  1957


segunda-feira, 30 de julho de 2012

DEPOIMENTO VIRTUAL DA MUSA MARÍLIA DE DIRCEU



Autor: Rogério de Alvarenga

Nem pensem que vão ficar sabendo tudo a meu respeito, a respeito da Marília de Dirceu, construída pelo poeta e Ouvidor da Corte em Vila Rica, Tomás Antônio Gonzaga! Há muitas coisas que tenho ainda medo de revelar. Meu nome verdadeiro é Maria Doroteia Joaquina de Seixas. Para a literatura, hoje, sou apenas Marília de Dirceu. Naquela época, final do século dezoito, eu aprovava esse apelido e me sentia o máximo. Depois, esse nome foi pesando tanto nas minhas lembranças, que não passa agora de ilusões, de poesia, de brumas do tempo.   Assim, trago o coração cheio de promessas... Como posso imaginar que tantas dificuldades do passado pudessem fazer a minha estrela brilhar nesse céu maravilhoso. Com o falecimento de minha mãe, quando eu era muito pequena, ainda, eu e os meus quatro irmãos passamos a residir com o meu avô, tenente-general Bernardo da Silva Ferrão. Mais tarde, meu tio muito amado, João Carlos da Silva Ferrão e minhas tias, cuidaram de mim. Meu lar foi cheio de carinhos e compreensão. Vivi em berço abençoado, Não havia nenhuma escola para moças. Eram proibidas. Então, já me sentia formada aos 12 anos, pronta e preparada para namorar e casar. E para casar precisava namorar. Pois namorei. Namorei mas não gostei de ninguém. Foi aí que apareceu a figura do Ouvidor.
Imaginem! O Ouvidor da Corte, um solteirão! Velho demais pra mim. Pela cara eu julgava que ele era da idade do meu avô. Não, brincadeira. Gostei mais da roupa dele, das túnicas, das camisas de punho rendado e todo bordado. Era louro dos olhos azuis. Rico? Nem pensei nisso quando o vi pela primeira vez. Meu avô disse que ele tinha o poder nas mãos. Mandava até no governador. Depois, vieram me contar que o nome dele era Tomás. Nem liguei. Só olhei pra a cara dele uma vez, muito discretamente e sem interesse nenhum. Era pessoa importante e de respeito na capitania. Se eu fosse conversar com ele, iria perguntar pelos filhos ou pelos netos. Fiquei sabendo que ele tinha mais de quarenta anos. Bobagem! Depois, fiquei sabendo que era disputado em Vila Rica. Penso que as moças da época vislumbravam o cargo dele. Bobagem. Eu não vou atrás de cargos. Sabe de uma coisa? Numa festa  no palácio do governador, pra todo lugar na sala que eu me dirigia, via logo a cara do Ouvidor perto de mim. Discretamente, arranjava um jeito e pulava fora. De longe, percebi que ele não tirava os olhos de mim. Fiquei com medo. Juro que fiquei pensando em tantas outras coisas que agarrei no braço do meu tio, que estava por perto. A noite passou com músicas e danças para as pessoas mais velhas. Uma surpresa que me assustou. No dia seguinte, minha tia me entregou uma carta fechada, com o carimbo da Corte. Maria Doroteia.
Abri na frente de todos na casa: “Bela Maria Doroteia! Impossível apagar da minha mente a deslumbrante presença da mais linda jovem de Vila Rica. Admirei o encanto dos teus cabelos, o brilho dos teus olhos, a rosa púrpura em teus lábios. A festa do Palácio não teria nada para mim, se lá não estivesses presente. Marília, se tens a beleza da natureza é um favor. Mas, aos vindouros teu nome passa é só por graça do Deus do amor, que terno inflama a mente e o peito do teu pastor. Com todo respeito do teu admirador, Tomás Antônio Gonzaga – Ouvidor da Corte.
Caí de costas. Fiquei mais vermelha do que as rubras rosas. Que petulante! No fundo, eu estava lisonjeada e inchada, como diziam. Minhas tias riram muito. Quando meu avô ficou sabendo, ele fez um muxoxo de desaprovação. “Você é uma criança! O Ouvidor passou dos quarenta. Isso não vai dar certo.” Uma palavra do meu avô, uma negativa ou uma afirmação, eram ordens pra mim. Tive um retrocesso. Depois, começaram a chegar mais liras para Marília. Com o tempo, passaram a ser dedicadas a Marília de Dirceu.  Ele escrevia liras constantemente, sempre pensando em mim, em meu suposto nome, uma suposta Marília. O Ouvidor e vários poetas, juristas, religiosos, militares  participavam de uma sociedade literária, Arcádia, e cada um tinha um pseudônimo. Ele escolheu Dirceu para ele. Assim, criou o meu nome poético ligado ao dele para compor Marília de Dirceu, como forma literária. Passei a ser a Marília de Dirceu, consagrada em suas liras. Uma revelação: todas as liras do Ouvidor, Tomás Antônio Gonzaga foram a mim dedicadas. Acredita que eu aceitei o namoro? Já tinha aceitado há muito tempo. Mas, como é que se namorava?  Um adeusinho, um sorriso, um olhar. Nada de beijo roubado. Nesse ponto digo a verdade. Ficamos noivos, sob os olhares do meu avô e dos meus tios e das minhas tias. Felicidade total. Conversávamos diariamente pelas nossas janelas, em gestos, sorrisos, beijos distantes. Agora também é verdade. Tínhamos os lenços brancos. Era assim o nosso romance, a continuidade do amor de minha primavera misteriosa. Era feliz, era amada, era louvada. Ele era um noivo apaixonado. Era uma pessoa que decididamente desejava o lar, a vida tranquila e bucólica. Casamento marcado. Preparação geral. Paixão! Paixão! Dia marcado para o nosso casamento. Nessa altura, eu estava também apaixonada, decididamente apaixonada pelo meu quarentão. Tudo preparado para o nosso casamento. Mas o casamento infelizmente, não se realizou.   Meu noivo foi preso oito dias antes do dia marcado para as bodas, implicado no movimento libertário da Inconfidência Mineira. Foi preso, encarcerado, incomunicável e, em seguida, transferido para o Rio de Janeiro, acorrentado, apesar do cargo de Ouvidor da Corte e de ser amigo do Governador, Visconde de Barbacena. Ficaram para mim as suas doces palavras: Nunca mais o vi. O meu coração partido e as minhas lágrimas não foram suficientes. Os meus familiares eram pessoas de influência política na capitania. Podiam interceder por ele? Meus tios eram militares, a serviço do governador e da Corte. Não poderiam interceder por traidor, por um conspirador. Os bens de todos os inconfidentes foram imediatamente confiscados. Quem se envolvesse era cúmplice. Tudo um desastre completo. A prisão inopinada de todos os conjurados e o confisco imediato dos seus bens. A devassa com todos os seus rigores. A morte horrível de Cláudio Manuel da Costa, ocorrida na prisão. A condução de todos os presos para o Rio de Janeiro, algemados e acorrentados. As imundas prisões. A execução espetaculosa de Tiradentes, alguns anos depois. 
O esquartejamento em praça pública. O sadismo exacerbado, as calúnias, as perseguições políticas, as denúncias oferecidas para granjear a simpatia do governador.  Tudo, um desastre. E o meu amor seria a menor parte dessas desgraças todas. Minha vida também corria perigo. A ordem geral era mesmo o recolhimento e o silêncio. Meu noivo sofreu as angústias no cárcere. A saudade, as dúvidas, as queixas, as lembranças do tempo passado na bucólica terra fértil, de ovelhas brancas, do puro leite e da fina lã. Suas esperanças ilusórias. Os interrogatórios. A vil traição. Não restou nem um fio de esperança. Nenhuma esperança. Meus familiares previam o desfecho da tragédia. Tive notícia de que ele seria condenado à forca. Como eu poderia ter um pensamento de alguma felicidade a encontrar nesta vida? Depois, houve a comutação da pena. Foi condenado ao degredo perpétuo na África. Assim foi feito. Ele desapareceu para sempre. Eu era realmente, nesse momento, uma noiva desesperançada! Saudoso tempo passado. Agora, só restaram lembranças. Guardei os meus lenços brancos, lavados e engomados, numa caixa toda bordada de borboletas azuis. Deixei-a perto da minha cabeceira e, ao me deitar, abria cada um deles, absorvia o seu perfume e, suavemente surgia à minha frente a imagem dele, com seu sorriso de sempre, trazendo uma nova lira, dedicada a Marília de Dirceu. Não sei quanto tempo assim ficava. Depois, dobrava cada lenço, conversando com eles. Colocava-os de novo na caixa bordada. Fechava-a cuidadosamente e sentia que as lágrimas desciam lentamente. Nunca chorei. Era sempre um pranto silencioso, abafado. As lágrimas não tinham permissão para cair. Meu mundo passou a ser isso. Suas palavras! No princípio do nosso namoro, eu fiquei apenas enlevada com a sedução de uma pessoa tão importante no cenário jurídico e político da capitania. Depois, fui me envolvendo. Finalmente, antes do desenlace, o amor me trouxe à realidade. Senti então que estava mesmo dentro de um momento de total felicidade, encontrando um homem a quem eu poderia entregar a minha vida por inteiro, que poderia desfalecer em seus braços. Seria amada e desejada por toda uma existência. Infelizmente as portas do destino se abriram para outros itinerários. Não tive o direito de ser feliz! A felicidade passou pela minha porta somente uma vez!
As marcas de uma paixão não se desfazem com um simples estalar de dedos. Um sentimento guardado silenciosamente é mais difícil de ser retirado do fundo do inconsciente. Vivi confortavelmente meus oitenta e seis anos como se fosse uma menina de dezessete. Hoje, ainda brinco de bonecas. 
Guardo pequenos bordados, lenços brancos. Tudo por compulsão. Um pedaço de pano branco?  Posso bordá-lo com uns peixinhos do mar. Para quê? Nem eu mesma sei. Será que meus últimos suspiros foram pensando nele? Talvez eu tivesse outras formas, outros espectros para avivar a minha memória. Nem posso afirmar que o tenha visto nos meus momentos finais, ao se apagarem as minhas luzes. Não chegou a mim nenhuma mensagem de alegria ou de dor. Ele deve ter tido uma vida afortunada na África. Nossos caminhos se desviaram, infelizmente. Que me resta? Ainda vivi alguns anos. Finalmente, em 1853 me despedi da minha terra, do meu eterno noivado. Mas, na vida não há passagem de retorno. Em vão, penso reviver o amor ardente. Impossível. Nem os dedos das minhas mãos me obedecem para fazer uma simples carícia, naquele rosto lindo, nas suaves expressões faciais de ternura infinda. Como posso dizer adeus à vida, sem ter realizado um simples sonho de adolescente? Minhas mãos estão trêmulas e o ar que respiro não aplaca os meus suspiros. Infelizmente, tenho que dizer adeus, assim mesmo. Digo finalmente para os jovens amantes que aproveitem a vida enquanto houver tempo. Depois disso, vem a desesperança. Inevitavelmente. Essa é a grande trapaça desta vida. Esperanças acumuladas, nunca realizadas. Desculpe-me, tenho que sair. Não estou suportando a mágoa das minhas lembranças. Adeus!

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