Cegueira
não é brincadeira. Cegueira não é metáfora, não é Saramago, (1922 – 2010)? É
uma forma cruel de brincar com os cegos. Decreto dos deuses.
As luzes se apagam, desce a cortina
da noite, da escuridão. Dizer adeus às luzes. Que alegria, que justificativa
pode um ser humano encontrar ainda nesta vida? Ninguém neste mundo pode avaliar
a mágoa de Andrea Bocelli, cego, cantando com os olhos fechados e um sorriso
forçado e triste, a cabeça levemente inclinada para baixo. Ou avaliar a mágoa
de Geraldo Magela, cego, ator comediante. Impossível dar as mãos à felicidade.
Impossível justificar, compreender, aceitar. A neurose vem junto e com ela a
tristeza, o abatimento, a revolta. “Ceguinho é a mãe”, ironicamente Geraldo
Magela faz humor, despistando outros sentimentos. Ri dele mesmo e o público
chora, em vez de somente rir com ele ou dele. Cegueira não é metáfora,
Espinosa, (1632 – 1677).
Tudo que vai ao cérebro, passa pelos
órgãos dos sentidos: visão, audição, gustação, olfação, cinestesia.
Quem precisa de óculos é deficiente
visual, quem não enxerga é cego. Impossível
pensar nas relações sociais sem o sentido da visão. O sofrimento é
incomensurável, embora seja íntimo e intransferível. A cegueira estável,
definitiva, passa a ser “invisível” para os familiares, para os amigos, para o
público. O mundo continua, a vida rola. Vale a pena? Muitas pessoas não
suportam sobreviver e se definem de imediato. Outras vão encontrando recursos
psicológicos alternativos, recebem ajuda, carinho, conforto. Nada verdadeiro
para quem sofre. Predomina a humildade a submissão aos desígnios da natureza.
Limites que prenunciam a lenta chegada da morte, enfim, parte por parte.
No treinamento da técnica de
Programação Neurolinguística, há uma sessão pedagógica em que a metade dos
participantes permanece o dia inteiro com os olhos totalmente vedados, e cada
um é acompanhado por colega determinado. Um dia inteiro. No dia seguinte,
trocam-se os papéis. Todas as atividades do curso decorrem normalmente. Depois,
no terceiro dia, vêm o debate e o relatório verbal de cada um. O sentimento
verbalizado por todos é que o limite ou a limitação da visão na vida ativa cai
mais de 50%, inclusive cognitivamente. As dificuldades estão presentes em todos
os momentos. A alimentação a higienização, as barreiras. A angústia, o
sofrimento. Passar por uma experiência sem luz faz compreender um pouco dessa
tragédia, mesmo sabendo que tudo seja um treinamento, um teatro.
A vida funciona na base do prazer de
viver. Não há outra razão. O prazer é o primeiro dos bens. A ausência de dor no
corpo e a ausência de inquietação da alma. Epicuro (341 - 271 a.C)
Sem êxtase, viver não é
preciso.
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