O garoto
Marcelinho estava estudando no Rio de Janeiro. Nas férias de julho, convidou um
colega de colégio para passar uns dias na fazenda do seu avô, em Santa Maria de
Itabira, interior do estado de Minas Gerais. O avô vivia numa bela fazenda, em
pleno conforto da modernidade, no meio de árvores frutíferas, de hortas, de
jardins e de animais. Natureza cheia de verdor, um céu aberto, um sol rutilante
e uma noite cheia de estrelas.
Marcelinho era
tratado como rei pelo avô e o carioca adolescente, visitante, de nome Gustavo,
deveria ser tratado, então, como príncipe.
Mas, o
carioquinha cheirava a asfalto, gás carbônico e muita maresia. Perguntava tudo,
queria saber de tudo. Era curioso demais. Falava o que pensava e o avô se
encantava com as perguntinhas dele.
- Essas galinhas
soltas no terreiro não fogem?
- Não! Não
fogem. Elas gostam daqui e da nossa proteção.
Gustavinho se
sentiu em casa, pronto e disposto para tudo. Na tarde do dia seguinte, foi
nadar no tanque, debaixo da cachoeira, no meio da mata. Foi um custo pra botar
o garoto em cima de um paciente cavalo.
- Não precisa de
carteira de habilitação pra montar a cavalo?
- Precisa só da
autorização do avô!
Os dois filhos
do vaqueiro eram acompanhantes do Marcelinho e do Gustavo. Pularam nas garupas
dos cavalos e Marcelinho comandou a expedição pelo no meio da mata. A pose e a
elegância do Marcelinho impressionaram o hóspede. Foi uma festa a cavalgada.
Melhor ainda foi o cachoeirão de água límpida e esvoaçante, caindo das rochas e
fazendo uma lagoa, pronta para ser nadada.
O carioca ficou
deslumbrado. Só tinha visto cachoeiras em filmes ou na televisão. Ali, no meio
da mata, achou que estava vivendo um paraíso.
E os dois filhos
do vaqueiro e Marcelinho tiraram a roupa num átimo e pularam na água fria.
Gustavinho ficou temeroso, e meio arredio. Depois começou a tirar a roupa
também e ficou com um belo calção de náilon vermelho e pulou na água. Fria
demais e gostosa demais.
Foi aí que ele
notou que todos os garotos nadavam pelados. Eles nunca precisavam de calção ou de
short para nadar. Percebeu que estava fora de moda e acabou tirando também o
seu calção. Foi aí que os dois filhos do vaqueiro começaram a rir. Riram de
verdade. Gustavinho percebeu que estava sendo a causa da gozação. Os irreverentes
filhos do vaqueiro ficaram ainda mais admirados e riam sem parar. Por quê?
- Bunda branca!
Eram as marcas
do sol na praia. Sem imaginar mais causas, nasce um apelido que começa pela
evidência. Estava mesmo bem moreno queimado de sol, e com a bunda branca. A
denominação era irreversível. Daí pra confirmar um apelido foi um pulo. Ninguém
mais conhecia Gustavo e sim, o “Bunda Branca.”
O avô riu muito
e pediu desculpas. Mas, com isso, a família inteira riu e adotou, mesmo às
escondidas, o apelido natural. Gustavinho gostou da brincadeira, gostou do
apelido e foi em frente, aproveitando o conforto da fazenda.
Depois,
Gustavinho queria saber como se tirava o leite. O avô explicou a técnica e
demonstrou. Gustavinho, na prática, apertava a teta da vaca, mas o leite não
esguichava. Por fim, quase deu certo. Suou para tirar um copo de leite. Com
mais um ano de prática ia conseguir tirar um litro de leite por hora.
O avô explicou
que cada vaca recebia um nome de batismo logo que desse a primeira cria. E
relacionou os nomes principais: Granada, Lubrina, Pintada, Guanabara, etc.
- Quando eu
chamo a Lubrina, ela vem e seu bezerro vem no mesmo momento.
- Não é
possível!
- Quando a vaca
pare pela primeira vez, eu registro o nome dela e ela aceita o nome para o
resto da vida.
- Quero
experimentar chamar uma vaca, amarrar e tirar o leite todo. Quero ser um
vaqueiro de verdade. Isso mesmo. Quero ser vaqueiro.
- E já está
contratado!!!
O avô ficou
encantado com a petulância e disposição do Gustavinho. Era bonito ver um jovem
querer ser um vaqueiro de verdade. Nem seu neto jamais tinha pensado em ser
vaqueiro.
Mas o atual vaqueiro,
Janjão, meio gozador, recomendou para que ele chamasse a Marajá, que era
mansinha e podia dar uma boa oportunidade para o Gustavinho treinar.
Gustavinho
gritou, imitando os vaqueiros:
- Marajá! Marajaaaá!
Marajaaaá!!!

Gustavinho pegou a corda de amarrar as pernas das vacas
e deu o laço com a maior perfeição. Pegou a balde, a toalha de limpar as tetas,
jogou no ombro e partiu para debaixo da barriga da Marajá. Ao agachar debaixo
da Marajá, notou que ela não tinha as quatro tetas e somente duas, representadas
pelo saco murcho, onde havia outrora,
dois bagos enormes do boi carreiro. Gritou para o avô:
- Oi, vô!!! Essa
vaca está com defeito!
E o caipira,
Janjão, veio tirar um sarro em cima do carioquinha? Não podia perder o emprego
pra esse tal de Gustavinho, já de contrato firmado com o avô.