sexta-feira, 23 de novembro de 2012

MANUSCRITO DE UM PRACINHA DA FEB

2ª GRANDE GUERRA MUNDIAL - 1939 A 1945

Conspira contra sua própria grandeza o povo que não cultua seus feitos heroicos.

O conflito iniciou-se com a invasão da Polônia pela Alemanha, em 1º de setembro de 1939, prosseguindo na Europa, envolvendo outros países e mesmo outros continentes, até a capitulação da Alemanha, em 7 de maio de 1945. A Alemanha fez aliança com a Itália e o Japão, países do eixo. De lado oposto ficaram a França, a Inglaterra e a Rússia, obtendo a participação dos Estados Unidos, formando a corrente dos aliados. 
A rendição da Alemanha aconteceu em Reims, na França e o dia 8 de maio de 1945 é o dia dedicado à comemoração da vitória. O chefe da nação brasileira, Getúlio Vargas, após ataques a navios brasileiros, declarou estado de guerra. E o Brasil participou efetivamente desse conflito, enviando a Força Expedicionária Brasileira à Itália. 

Síntese da participação do Brasil na guerra

Estes dados, muito resumidos, proporcionam uma visão guestáltica dos resultados da participação do Brasil nesse conflito mundial.
- Efetivo total da FEB                                                  25.394
- Prisioneiros capturados                                              29.663
- Integrantes da FEB aprisionados pelos inimigos                  35
- Mortos da FEB em operações de guerra                            465
- Feridos em operação de guerra                                     2.722
- Extraviados e ainda não recuperados                                 16

(Dados da Associação Nacional de Veteranos da FEB – Belo Horizonte - Av. Francisco Sales, 199 – Floresta – tel.031.3224.9891 ou 3224.8021)
  
Canção do Expedicionário

Letra de Guilherme de Almeida
Música de Spartaco Rossi

Você sabe de onde eu venho?/ Venho do morro, do engenho,/ das selvas, dos cafezais,/ da boa terra do coco,/ da choupana onde um é pouco,/ dois é bom três é demais,/ venho das praias sedosas,/ das montanhas alterosas,/ dos pampas, do seringal,/ das margens crespas dos rios,/ dos verdes mares bravios,/ da minha terra natal./ Por mais terras que eu percorra/ não permita Deus que eu morra/ sem que volte para lá,/ sem que leve por divisa/ esse “v” que simboliza/ a vitória que virá./ Nossa vitória final/ que é a mira do meu fuzil,/ a ração do meu bornal,/ a água do meu cantil,/ as asas do meu ideal,/ a glória do meu Brasil./ ... 


MANUSCRITO DE UM PRACINHA DA FEB - Força Expedicionária Brasileira-

João Fernandes Vieira (1913 – 2005). Era natural do município de Passabém (MG) – Convocado pelo Exercito Brasileiro, para participar da ll Grande Guerra Mundial, tornou-se o soldado 721 do 10º.Batalhão de Caçadores,  sediado em Porto Seguro, em vigilância a 130 km de litoral. Era motorista profissional e, por este motivo, foi incorporado extemporaneamente, com 29 anos de idade. Tinha 1.75m de altura e pesava aproximadamente 90 kg.
Numa caderneta, adquirida na Casa Novo Mundo, de Manuel Fernandes de Almeida, rua Portugal, Porto Seguro, Bahia, em 1943, João Fernandes Vieira, o soldado 721, registrou anotações que fotografam um momento da história do Brasil, nas suas precariedades, nas suas grandezas e, sobretudo, na crença da contribuição efetiva de nacionalidade patriótica. Eis a transcrição do manuscrito na simplicidade das suas palavras:
Descrição da viagem para a Bahia. Saí de Belo Horizonte no dia 19 de abril de 1943, às três horas da madrugada. Fui para Ouro Preto. Pegamos o trem às 4h50 da manhã. Paramos em Burnier. Aí, baldeamos para outro trem e chegamos em Ouro Preto a uma hora da tarde. Fomos para o quartel. Na nossa chegada, foram presos dois companheiros e tivemos uma péssima impressão. Às duas, fomos almoçar. Foi um ótimo almoço. Depois, fomos para a 3ª.Companhia e fomos recebidos com um sermão do Mariano Henrique de Miranda Sá Sobral (nome fictício). Foi uma coisa terrível. Uma instrução no duro. Não descansamos nada.
À noite, dormimos no soalho limpo. Foi um frio terrível. Às cinco horas, acordamos com o apito dele e nos deu uma ordem unida, sem tomar café. Quase morremos de cansados. Depois que tomamos café, fomos receber a farda. No segundo expediente, houve ordem unida e, à tarde, na hora do boletim, foi um discurso nos tratando de animal. Foi assim até sair de Ouro Preto.
Houve uma festa para os soldados, comunhão geral e todos os que eram católicos confessaram e comungaram. O tenente disse que quem quisesse confessar, podia. Para ele, era uma besteira, por não crer em nada nessa religião, mas deu liberdade. Foi uma festa muito bonita. Depois da comunhão, foram servidos café e pão. Repartiram no meio da rua. Foi a nossa festa.
Com viagem marcada, fui pedir para ir a Belo Horizonte para despedir. Ele me respondeu que depois que eu saí de casa, nada devia me interessar mais. Nem notícia, porque ele não interessava por notícia de casa, porque a nação estava em guerra. Por isso, não dava licença, mas os meus companheiros podiam ir. Eu fui por minha conta. Quando cheguei, ele me pôs de revista. O coronel não queria que fizesse nada com os soldados porque iam para longe, precisavam despedir e não fizesse nada conosco.
Chegando de Belo Horizonte, botava sangue pelo nariz e estava muito gripado. Fui ao médico e ele me pôs de observação até o dia oito, de tarde. O tenente mandou que eu fosse ajudar a carregar o carro de bagagem. Eu não podia fazer força que o sangue estava saindo. Ele chegou, no meio de umas mil pessoas e me desacatou no duro. Você veio aqui pra servir ou para comer? O tenente Gonçalves falou comigo, na vista dele, que eu podia ficar à toa, porque eu estava doente. Houve cinema para todos os soldados. Ele não me deixou assistir à sessão. À noite, fui despedir do Moacir e expliquei a ele tudo. No dia seguinte, levantamos às três horas e recebemos o café e a ração para comer na estrada. Saímos para a estação de trem às oito horas. Ficamos em forma até as dez horas. Às onze horas, partimos. Foi uma despedida triste. Gente chorando que fazia dó. Tanto os soldados como o povo. Menos eu que não tinha ninguém pra chorar por mim. O maquinista deu uma manobra de um quilômetro. Passou na estação com toda velocidade. Foi triste a despedida.
Almoçamos no trem. Chegamos a Lafaiete às duas horas. Arriamos as mochilas no meio de um cinzeiro que era uma coisa terrível. Tivemos ordem de passear duas horas e às seis horas fomos jantar. Quando recebi a boia, comecei a botar sangue pelo nariz. Quando chegou “a onça”, esculhambando comigo. Saí dali. Maldade. Eu justifiquei, então ele parou de me xingar no meio de tanta gente. Saímos de Lafaiete às sete horas e chegamos em Juiz de Fora às quatro horas da manhã. Lá, tomamos café. Saímos às seis horas e fomos almoçar em Barra do Piraí, às duas horas, ouvindo tudo quanto era xingatório e grito do Sobral. Em Barra do Piraí, tivemos ordem de passear uma hora. Saí para comprar uma colher para almoçar, porque estava comendo com a mão. Encontrei com o tenente. Ele perguntou aonde eu ia. Respondi que ia comprar uma colher. Ele gritou no meio da praça: Volta pra trás! Voltei quase chorando de vergonha. Tive que comer com a mão, pois já estava quase morto de fome. Faltei só apanhar. Saímos de lá às três horas e chegamos ao Rio de Janeiro às onze horas da noite. Fomos jantar debaixo de chuva. Uma boia terrível, cheia de areia. Lá, ele expulsou dois colegas, tirou toda a roupa e calçado, só deixou com o culote e sem jantar entregou à polícia. Ouvi um dos capitães falar que era um absurdo fazer aquilo, pelo menos dar o jantar e a roupa aos homens.
Às duas horas da madrugada, encostaram o trem e nós desembarcamos debaixo de grito. Fizemos uma marcha no meio da cidade e ele falando: quem quiser ter alguma recordação do Rio, observa bem esses prédios. Tivemos uma impressão terrível porque estávamos enganados. Não sabíamos para onde íamos, porque ele sempre falava que sabíamos para onde íamos. Entramos para o navio Itaquera. Recebemos uma esteira para abrir. Deitamos no convés do navio, eu com uma dor de barriga formidável. Fui falar com o tenente que estava passando mal. Ele quase me bateu. Comecei a dormir, quando acordei todo molhado de chuva. O dia começou a clarear. Dei meu número para visita médica. Sobral falou com o médico que eu não tinha nada. Ele me receitou uma injeção, quando obtive melhora. Depois tivemos que andar para o navio Itanager. Ficamos um dia de falha. Trabalhamos a noite toda. Não descansamos.
No dia seguinte, tivemos ordem de passear. Quando saímos, ele nos deu uma nova ordem que não podíamos passear longe. Então, fui escrever uma carta e telegrafar.  Quando cheguei, não encontrei mais ninguém. Já estavam todos no outro navio. Sobral encontrou comigo, fez ameaças de me bater, esculhambou comigo no meio de umas cinco mil pessoas. Pedi licença e fui buscar a mochila e o fuzil. Só não me bateu, mas no mais, tudo. Daí a meia hora, saímos do Rio. Foi outra despedida triste. Saímos às três horas da tarde do dia doze de maio de 1943.



3 comentários:

  1. legal as anotações do pracinha. através do relato pode-se imaginar o quanto era difícil até ir pra guerra. As imagens estão excelentes também.

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  2. meu avô foi pracinha na II guerra, ele contava várias histórias, algumas era somente imaginação outras eram verdades

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  3. Sr João era um vizinho meu e grande amigo.S
    audades

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