Governador que implantou os Grupos Escolares e o ensino público no estado de Minas Gerais. Referência nacional como republicano e como governador que seria indicado para presidência do Brasil, não tivesse falecido em 1908, no Palácio da Liberdade – Belo Horizonte.
AUTOR: Rogério Alvarenga
Apresentação
Esta entrevista virtual com João Pinheiro
da Silva nos traz à memória fatos ocorridos no final do século XIX e no
alvorecer do século XX.
João
Pinheiro ocupou o cargo de Presidente do estado de Minas Gerais por duas vezes.
Uma, na antiga Capital, Ouro Preto e a segunda, na nova Belo Horizonte, apos 9
anos da sua implantação, ocorrida em 1897. João Pinheiro cuidou das coisas do
estado e deixou como herança para a sua esposa, um nome respeitado, 12 filhos jovens,
dívidas da Cerâmica de Caeté, e inúmeros amigos leais.
ENTREVISTADOR:
Senhor Presidente do estado de Minas
Gerais! Cumprimento-o solenemente, no momento em que a República, tão almejada
pelos jovens políticos, nesse final do século XIX, encontra-se implantada e em
pleno exercício!
JOÃO PINHEIRO
Cumprimento-o também, com muito afeto e
consideração! Lutamos por ela, pela república, desde o tempo do meu curso
jurídico na Faculdade de Direito de São Paulo. Tive colegas brilhantes e todos
nós, unidos, nos empenhamos em consolidar o regime republicano no Brasil.
Entrevistador - Presidente ou governador do
estado de Minas Gerais?
JP - Na época, o cargo era de presidente,
mas com as funções correspondentes a governador.
Entrevistador - Lutando pela república,
isto é, contra a monarquia, contra dom Pedro II?
JP - Exatamente. Sempre inspirados no
positivismo de Augusto Comte, no sentido da realidade concreta e na negação às
teorias e ao debate estéril, sem objetividade. O poder do povo.
Entrevistador - Mas esse mesmo positivismo
não confrontava princípios da religião católica da época?
JP - É verdade. Entretanto, não entrávamos
em conflito religioso. Minha formação cristã era muito forte, pois sempre
acompanhei os preceitos da igreja católica, Recebi instruções do meu professor,
Padre João de Santo Antônio.
Entrevistador - Mas o senhor é filho de
imigrante?
JP - Sim! Meu pai, Giuseppe Pignataro, era
imigrante italiano, funileiro. Pobre! Naturalizou-se brasileiro com o nome de
José Pinheiro da Silva. Ele fez a tradução livre do seu nome para o português e
ainda queria ter um sobrenome bastante divulgado no Brasil...Acrescentou
“Silva”, para ser realmente brasileiro.
Entrevistador - E casou-se com brasileira?
JP - Casou-se com Carolina Augusta de
Morais, natural de Caeté. O casamento foi realizado em 1854, na capital Ouro
Preto. Em seguida, fixou residência na cidade do Serro.
Entrevistador - O senhor é o filho mais
velho?
JP - Meus pais tiveram três filhos homens.
José, nascido em 1856, João, em 1859, falecido antes dos 12 meses. E,
finalmente, eu, João, nascido em 16 de dezembro de 1860. Todos nós nascemos na
cidade do Serro.
JP - Muitas dificuldades. Meu pai faleceu
em 1870, portanto eu tinha apenas 10 anos de idade. Meu irmão, José, entrou
para o seminário, tornou-se padre, em 1879. Minha mãe retornou à sua cidade
natal, Caeté. Eu também estive no seminário de Mariana, estudando
gratuitamente, sob os cuidados do padre João de Santo Antônio, mas até a época
em que pude prestar exames na Escola de Minas de Ouro Preto.
Entrevistador - A família não tinha bens?
JP - Minha mãe, depois de viúva, passou por
grandes dificuldades, socorrida por parentes e amigos, vivendo em Ouro Preto,
Guanhães e finalmente na sua cidade de Caeté.
Entrevistador - O senhor não quis tornar-se
padre, mesmo estudando no Seminário de Mariana?
JP - Tinha outros itinerários para a minha
vida. Estudei muito e fiz os exames, logo que me julguei capaz, para ingressar
na Escola Engenharia de Minas de Ouro Preto. Aprendi na História a incessante
luta dos oprimidos contra os opressores, até mesmo no cenário de Ouro Preto. Eu
era um plebeu atrevido, disposto a lutar contra o patriarcado e a monarquia.
Entrevistador - Formou-se em engenharia?
JP - Abandonei o curso no terceiro ano. Vi
que não era isso que queria para a minha vida. Eu sou obstinado e sei o que
quero desde a minha infância. Meu pai e minha mãe moldaram minha personalidade
para uma vida de liberdade e de vontade própria. Sempre soube traçar o meu
destino. Sei o rumo do meu barco.
JP - Para a Faculdade de Direito de São
Paulo! Como fui? Nem posso imaginar as dificuldades que passei e nem imaginar o
desespero de minha mãe e de meu irmão, vendo-me partir tão desprotegido pela
sorte. Tinha que lutar. O meu pai, Giuseppe, não veio de muito mais distante? A
minha viagem, em comparação, era muito menor e muito menos perigosa. Mariana e
Ouro Preto impuseram obstinação nas minhas vontades e força no meu coração
Entrevistador - Em São Paulo? Na mais
famosa Faculdade de Direito do país!
JP - Sobrevivi! Lutei muito! Minha força de
vontade, entretanto, era maior do que as dificuldades. Não tinha passagem de
volta! Consegui me matricular no ano de 1883. Fui um aluno de mérito e de
destaque entre tantos outros exponenciais da época. Lá estavam, como colegas,
Washington Luiz, Antônio Carlos Ribeiro de Andrada, Afonso Arinos, Mendes
Pimentel, Raul Pompéia, entre outros.
Entrevistador - Como sobreviveu?
JP - Trabalhei como revisor de jornais e
lecionava para me manter. Por concurso, tornei-se Preparador de Física da
Escola Normal da República.
Entrevistador - Conseguiu formar-se na
Faculdade de Direito?
JP - Claro que sim! Terminei o curso jurídico,
recebendo o diploma em 18 de novembro de 1887. Tinha então 27 anos de
idade.
Entrevistador - Com o diploma na mão, que
rumo tomou?
JP - Abri uma banca de advocacia em Ouro
Preto, então capital de Minas Gerais, onde me dediquei a trabalho intenso. Precisava
ganhar dinheiro e continuar a minha luta pelos meus ideais republicanos.
Entrevistador - Continuou também o seu
engajamento político, iniciado na Faculdade de Direito?
JP - Inevitavelmente! A par do meu trabalho no campo jurídico,
comecei a me entrosar com os simpatizantes do movimento republicano da capital
Ouro Preto. Participei da fundação do Partido Republicano, fundado em 4 de
junho. Fundamos o Clube Republicano em 1888. Fundamos também um jornal “O
Movimento”, com pregação da abolição da escravatura e dos ideais
republicanos.
Entrevistador - E continuou republicano?
JP - Sou republicano desde moço. Minha conduta é
republicana. Minha formação! Meus ideais! Meus princípios dentro do positivismo
de Augusto Comte, o filósofo francês que deixou marcas até na nossa bandeira:
“ordem e progresso”! Sempre preocupado com o progresso.
Entrevistador - Já era casado, nessa época?
JP - Casei-me com a linda Helena de Barros,
em 25 de janeiro de 1890, portanto, quando já tinha 30 anos de idade. Tivemos a
felicidade sempre perto de nós, numa união que nos proporcionou a alegria e a
vontade de viver. Sempre estávamos juntos nos nossos ideais e na nossa
disposição para enfrentar as intempéries desta vida.
Entrevistador - Logo foi chamado a
integrar-se ao governo do estado?
JP - Sim. Fui convidado para Secretário,
por nomeação do Governo Provisório e, mais tarde, para Vice-Governador.
Entrevistador - E depois, a governador?
JP - Quando da indicação do governador
Cesário Alvim para o alto cargo de Ministro do Interior, fui conduzido
conseqüentemente ao governo do estado. Esclareço que sempre fui amigo e fiel
companheiro do governador Cesário Alvim. Seguia-lhe os passos e nunca deixei de
dedicar todo o meu reconhecimento e a minha amizade a ele.
Entrevistador - E assim, assumiu, tão
repentinamente, o governo do estado!
JP - O governador Cesário Alvim passou-me o
cargo, pois eu era o primeiro Vice-Governador. Uma consequência natural. Nesse
cargo fiquei no período de 11 de fevereiro a 24 de agosto de 1890, quando fui
substituído por Chrispim Jacques Bias Fortes.
Entrevistador - Foi o ponto inicial de sua
brilhante carreira política?
JP - Candidatei-me ao Congresso
Constituinte Federal e fui eleito em 15 de setembro de 1890, como representante
de Minas Gerais, na comissão composta de 21 membros, um de cada estado da
Federação.
Entrevistador - Mas o senhor, algum tempo
depois, tomou uma medida drástica!
JP - Acontecimentos inesperados na vida de
um político! Meu amigo e correligionário, Cesário Alvim, estadista republicano,
em 17 de fevereiro de 1892, renuncia ao seu segundo período como governador de
Minas Gerais. Em ato contínuo, eu, como amigo e companheiro, me afastei da
política imediatamente, como gesto de solidariedade.
Entrevistador - Um gesto de fidalguia, de
gratidão a um amigo e correligionário republicano, mas uma carreira política
alvissareira transformada em pó!
JP - Mesmo que fosse transformada em pó,
contanto que a amizade e a fidelidade partidária fossem mantidas. Meus valores
mais íntimos teriam me obrigado a atos muito mais audaciosos do que esse. Nunca
me arrependi. Minha vitória é a voz da
minha consciência partidária.
Entrevistador - Um brilhante republicano,
de formação jurídica assegurada, sem rumos para o seu barco, novamente!
JP - Meu barco nunca esteve sem rumo.
Adquiri a Chácara do Tinoco em Caeté, com o objetivo de instalar uma indústria
de cerâmica em louças finas e porcelana. Iniciar a era da industrialização na
cidade de minha mãe e de meus familiares maternos. Era a Cerâmica de Caeté! .
Entrevistador - Um ex-governador comandar
uma pequena e incipiente indústria de louças? Parece, a meus olhos, uma queda
vertical, sem desmerecer os ideais de industrialização que apossaram dos jovens
da época.
JP - Realmente pode parecer que assim ficou
na imaginação dos companheiros e amigos. Foi, sem dúvida, uma retirada
estratégica. Entretanto, pude armazenar forças, viver com a minha família, com
meus filhos... Sentir a vida chegar e a vida passar, na construção de um lar.
Entrevistador - Na Chácara do Tinoco?
JP - Esta Chácara do Tinoco foi adquirida
por mim em 14 de abril de 1892, por quatro contos e quinhentos. Ela servia de
residência ao Barão de Cocais. Agora abriga a família do Oleiro de Caeté! Esta
é a terra da minha mãe, Carolina, que nos abriga e nos faz unidos e felizes,
Entrevistador - E o novo jurista industrial
transferiu sua residência para a cidade mineira de Caeté!
JP - Deixamos Ouro Preto, a nossa capital,
em 1894, com muito pesar pelas amizades conquistadas, mas certo de que estava trilhando
outros ideais. Nunca perdi meu rumo e meu objetivo de vida. .Se eu tomei uma
decisão é porque havia uma força maior me impulsionando isso. O ser humano tem
todas as condições para tomar qualquer decisão em sua vida.
Entrevistador - E fez a mudança dos seus
bens e de sua família!
JP - Com as dificuldades naturais, fizemos
nossa viagem até Caeté, com Helena e nossos três filhos.
Entrevistador - Compreendo essas
dificuldades da época. Mas a indústria teve sucesso?
JP - Muito trabalho. Tivemos que importar
máquinas e contratar trabalhadores estrangeiros. Trabalhamos com afinco e
tivemos ainda que construir modelos para melhor desempenho e produtividade.
Inventamos o mono-rail, isto é, um carro sobre um só trilho para transportar o
barro, nossa matéria prima. E tivemos
que introduzir outros modelos ao processo de produção, para facilitar o
trabalho humano, aumentar a capacidade das máquinas, diminuindo custos e
aumentando resultados.
Entrevistador - Na nova vida na cidade de
Caeté, conseguiu, afinal, dedicar-se exclusivamente à sua indústria,
abandonando suas aspirações políticas!
JP - Inicialmente, parece que sim. Mas as
contingências humanas são fatores que nos obrigam a despertar nossas paixões,
por mais recalcadas que elas estiverem no nosso inconsciente.
Entrevistador - Novos amigos, novas
contingências, novo envolvimento político?
JP - Acredite! Como num passo de mágica, me
envolvi novamente no meio político municipal, E, dessa vez, fui conduzido a
presidente da Câmara Municipal e Agente Executivo de Caeté, em 1o.
de janeiro de 1899. Nessa época, Ouro Preto já não era mais a capital do estado
de Minas Gerais.
Entrevistador - A capital do estado de
Minas Gerais foi transferida para Belo Horizonte!
JP - Exatamente! Em 1897! O presidente do
Congresso Mineiro, Chrispim Jacques Bias Fortes, no dia 12 de dezembro de 1897,
instalou a nova capital, edificada numa região central do estado, equidistante,
na medida do possível, de todos os seus municípios.
Entrevistador - E o novo Partido
Republicano Mineiro, o famoso PRM?
JP - Na nova capital do estado, Belo
Horizonte, foi realizada a convenção do Partido Republicano Mineiro, com a
finalidade de indicar um candidato próprio à presidência do estado, nas
eleições do ano próximo.
Entrevistador - E o senhor foi o indicado
pelo PRM como candidato à presidência do estado?
JP - E fui eleito também presidente do
estado de Minas Gerais nas eleições realizadas no dia 7 de março de 1906, para
o quadriênio 1906/ 1910, tendo como companheiro de chapa Júlio Bueno Brandão.
Entrevistador - E para a Presidência da
República?
JP - Foi eleito Afonso Pena, também
representante do PRM.
Entrevistador - Senhor Presidente do estado
de Minas Gerais, ou melhor, Governador! Quais as metas?
JP - Duas metas básicas: agricultura e
educação. E mais: restauração do sistema econômico do estado, reforma do ensino
e reorganização da justiça pública.
JP - Na agricultura, implantar novos
métodos de trabalho, com a utilização de máquinas e implementos agrícolas, com
a busca incessante de experiências conquistadas pelos povos mais desenvolvidos.
Acompanhei de perto a implantação, organização e desenvolvimento de núcleos
agrícolas, para disseminar conhecimentos e técnicas.
Entrevistador - Acompanhava de perto esse
trabalho?
JP - Com todas as dificuldades de
transporte da época, estava sempre presente, verificando a implantação de novos
métodos de trabalho nos núcleos agrícolas.
Entrevistador - Mas quanto à educação e ao
ensino?
JP - Instituí o sistema dos GRUPOS
ESCOLARES, no estado. Uma ideia antiga, uma lacuna que o sistema republicano
não podia suportar. Eu mesmo, antes da morte do meu pai, com as nossas
dificuldades financeiras, tive que ser alfabetizado por esmola. Sempre tive meu
coração amargurado por isso. Só havia escolas isoladas, com um professor que
atendia a um grupo de alunos com formação heterogênea, isto é, em diversos
níveis de desenvolvimento no processo de alfabetização, de escrita, de leitura
e de contas.
Entrevistador - E como foi?
JP -
Tive a sorte de ter nomeado como Secretário de Estado do Interior o grande e
valoroso amigo, Manoel Tomás de Carvalho Brito. Era um ousado intelectual, com
ampla visão de futuro. Nós, Juntos, elaboramos o projeto de desenvolvimento do
ensino mineiro e implantamos sem mais delongas.
Entrevistador - Em que consistia esse
projeto?
JP - Administração pública responsável pela
manutenção do ensino primário, realizado em locais adequadamente preparados,
com professores remunerados pelo estado, gratuidade total por parte dos alunos
e obrigatoriedade de os jovens frequentarem as escolas, então organizadas. No
artigo 22 do Decreto, previa a construção de prédios escolares, aquisição de
equipamentos. O mobiliário seria de escolha e adoção do governo.
JP - Isso mesmo. Assinei a Lei no. 439 de
28 de setembro de 1906 e fizemos, não uma reforma no ensino, mas a sua
implantação definitiva, a bem da cultura mineira. Envolvia o ato normas de
funcionamento do ensino primário, normal e superior. Essa lei foi regulamentada
pelo Decreto 1969 de 3 de janeiro de 1907.
Entrevistador - E o senhor acompanhou o
processo de criação dos Grupos Escolares?
JP - Pessoalmente, quando podia. Fui à
inauguração do Grupo Escolar em Diamantina. Dona Julia Kubitschek era uma das
professoras de uma das escolas isoladas. Os professores tinham exaustivo
trabalho, em redobrado esforço, pois ensinavam alunos de quatro classes ao
mesmo tempo. Nunca aceitei esse procedimento. Agora, cada professora cuidava de
apenas uma classe. Fomos pessoalmente à inauguração do Grupo Escolar de
Diamantina. Juscelino Kubitschek tinha na época 4 anos de idade e acompanhava a
sua mãe, à nossa chegada na cidade.
Entrevistador - Houve uma grande recepção!
JP - Com justiça, foi uma grande
participação da população a esse acontecimento. Depois, seguimos para a minha
cidade do Serro, onde fizemos também outra inauguração de Grupo Escolar.
Entrevistador - Uma revolução social e uma
conquista do povo mineiro!
JP - Uma conquista do povo mineiro,
acompanhando os povos mais civilizados do mundo. Hoje, talvez, muitas pessoas
não estejam seguras quanto ao valor do nosso empreendimento. Mas, confesso que,
para mim, naquele momento, foi uma das maiores e, talvez, a mais significativa
e gratificante ação do meu governo.
Entrevistador - Seu filho, Israel Pinheiro
da Silva, construiu uma capital, o senhor construiu um estado, pelo
desenvolvimento cultural sem limites de tempo, de espaço, na formação dos
valores e princípios de um povo.
JP -
Tinha convicção inabalável do que estava fazendo. Nunca, ninguém, me tiraria o
entusiasmo desse empreendimento.
Entrevistador - O senhor também criou o Instituto Histórico e
Geográfico de Minas Gerais!
JP - Juntamente com centenas de outros
companheiros, intelectuais e historiadores, fundamos esse centro de cultura e de
documentação da história de nossa terra.
Entrevistador - É uma instituição que agora
completou o seu primeiro centenário e foi erigida pela sua orientação e sua fé.
JP - Realmente, não posso negar. A ata de
instalação do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais foi lavrada pelo
suplente do 2o. secretário, Luiz Peçanha e assinada por mim, no dia
15 de agosto de 1907, às 3 horas da tarde, no salão da Câmara dos Deputados.
Como fundador, assumi também o cargo de seu primeiro presidente, o que muito me
honra.
Entrevistador - Decisões superiores interromperam o seu mandato, embora houvesse
uma corrente política que acreditava que o senhor seria o novo presidente do
país, na sucessão natural de Afonso Pena. Seria por certo, o novo presidente da
república.
JP - Inevitavelmente, foram decisões
superiores que interromperam a minha jornada política. Minha energia vital foi
se esvaindo por moléstia incurável e avassaladora. Tive que me curvar diante dessas decisões
superiores que se me enlaçaram para o final da minha vida. Um câncer na laringe
me atacou irremediavelmente.
Entrevistador - Um desastre!
JP - Um desastre! O padre João de Santo
Antônio, que me acompanhou e me orientou pela vida afora, que me trouxe o
batismo quando era criança na cidade do Serro, também trouxe para mim a sua
presença com os derradeiros sacramentos e suas benditas mãos fecharam os meus
olhos para sempre.
Entrevistador - Morria assim o grande
estadista mineiro!
JP - Nada mais a discutir com relação a
ordens superiores. Deixei a presidência do estado de Minas Gerais no dia 25 de
outubro de 1908, com 48 anos de idade.
Entrevistador - E a sua família?
JP - Quando revejo o dia da minha
despedida, me converto em lágrimas. A minha querida Helena, minha esposa e
companheira, teve que enfrentar muitas dificuldades na criação dos nossos
filhos. Sempre me preocupei com a economia do estado e me esqueci de formar um patrimônio
para a minha própria família. Helena, hoje, por onde começar? Me perdoe! Que fazer? Não posso me erguer e nem meus
pensamentos voariam para solucionar questões insolúveis. Deixei-lhe o legado de
um nome respeitado, uma família de doze filhos, além das dívidas da Cerâmica de
Caeté, muitos amigos leais e um grande problema: não possuir nem casa para
morar. Meu filho mais velho, Paulo, tinha 16 anos e a filha mais nova, Ruth,
apenas, seis meses. Antevi, minutos antes das minhas despedidas, que a herança
maior que poderia ter deixado mesmo, seriam as minhas palavras, por tantas
cartas que escrevi a meus filhos, o meu exemplo, exemplo de lealdade para os
meus amigos e correligionários, e a minha vida de ação.
Entrevistador - E o seu filho Israel foi o
construtor de Brasília!
JP - Um poder místico de sua firmeza de
caráter e de sua coragem. Ele sempre relia as minhas cartas e mantinha contato
comigo em planos de meditação constante. As palavras simples e contundentes
traziam para Israel uma mensagem de poder e de obsessão. Essas cartas foram o
instrumento de nossas conversas em meditação profunda. Via que ele sempre saía
com os olhos marejados de lágrimas e me abraçava e me beijava nas minhas
cartas. Simples cartas de palavras de proteção, vindas do além. Ele seguiu meus
passos.
Entrevistador - Depois de tantos momentos
de recordação, gostaria de deixar uma mensagem?
JP - Agradeço assim à minha família, aos
meus amigos, dizendo que sempre fiz o que pude por eles, por isso mesmo, me
esqueci de mim!
Entrevistador - Comovido, eu me despeço de
Vossa Excelência, na convicção de que suas palavras hão de pairar sobre o
ideário do povo mineiro.
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