sexta-feira, 28 de junho de 2019

É PRECISO PRENDER O LEITOR

O autor tem que se postar como delegado. Algemas virtuais e muito conforto nos cárceres. As chaves ficam com os carcereiros. Saídas só com habeas corpus. Buscá-lo em casa, sem aviso prévio, sempre que houver novo flagrante.





Autor – Bom dia, leitor! Poderia me esperar um minutinho?
Leitor – Bom dia, mas estou com pressa. Como estou de férias, vou pegar um sol no clube. Estou de saída.
Autor – Tenho um assunto importante para discutir com você. Houve um acidente com o cachorrinho do Miguel na rua Campo Sales.
L – E você chama isso de assunto importante? Vou ter que sair.
A – O cachorro era vira-lata, mas amigo íntimo do garoto de 10 anos. O Miguel fazia dele um irmão. E o cachorro era um fiel companheiro.
L – Essa história é antiga.
A – O garoto carregou o cachorro para dentro de casa e colocou-o com cuidado num balaio, forrado por uma toalha de banho. O cachorro apenas gemia baixinho e o Miguel soluçava.
L – Sem novidade! Estou perdendo meu tempo, meu sol.
A – O pai do Miguel estava no trabalho e não podia atender. A mãe tentou confortar. Miguel decidiu levar o cachorro a um hospital veterinário. Onde? Como? Miguel, apressado. Seu amigo podia morrer. Não sangrava, mas estava com ossos quebrados. Apenas gemia e tinha os olhos vidrados, sempre fixos no Miguel, como se estivesse pedindo socorro.
L – E esse vira-lata tinha nome?
A – Era o Chibom. E o Miguel tomou a decisão imediata. Levar o Chibom a uma clínica e salvá-lo. A mãe não permitiu que ele fizesse isso sozinho.
L – Garanto que esse vira-lata morreu!
A – É verdade. Miguel tinha dinheiro guardado, chamou um táxi e desapareceu, carregando o Chibom numa cesta. A mãe nem tinha percebido a fuga dele. O taxista se comoveu com os seus passageiros e encontrou uma clínica nas imediações. Miguel ficou sozinho na porta da clínica. Protocolo. Nome, CPF, endereço, etc, etc... Miguel explodiu: “enquanto respondo, o Chibom está sofrendo. É caso de urgência”. Finalmente, chegou o veterinário, examinou e foi logo dizendo: “não há nada a fazer. Está morto”. E o garoto: “Não pode! Tem que fazer alguma coisa!” “Se quiser, pode deixá-lo aqui, para cremação.” “Isso nunca. Chibom é meu amigo.”
L – Isso tudo é papo furado.
A – Nesse momento, chega o pai do Miguel. “tudo acabado, pai.” Miguel não chorava, mas suas lágrimas rolavam sem a sua autorização. E o pai: “Não tem importância, filho. Compro outro cachorro pra você”. “Não tem importância, pai? O Chibom é meu amigo e eu não vou trocá-lo por nada.” “OK. Tudo bem, deixe o cachorro na clínica e vamos para casa.” “Deixar o meu amigo morto na clínica? Isso, nunca. Quero levar para casa”. E o pai: “Levar cachorro morto pra casa? Isso fica difícil, filho!”. Miguel sentenciou: “Nunca abandono meu amigo. Sei que ele fazia tudo por mim. Quero ficar com ele. Não abandono meu amigo”.
L – E levaram o cachorro morto pra casa?
A – O pai não teve alternativa. Pegou o balaio com o cachorro para colocá-lo no carro. Miguel pulou na frente: “eu mesmo carrego.” Não aceitou ajuda do pai.
L – Vai me dizer que teve velório de cachorro?
A – Claro! Com velas e flores. À noite, luzes apagadas. Miguel deitou no chão, perto do Chibom e adormeceu. Chegaram colegas e a sala encheu. Foi quando uma amiga da mãe telefonou. “Alcione! Que aconteceu? Estamos esperando você para o meu aniversário e até agora! Esqueceu-se de mim?” Claro que não, Flora. Aconteceu um desastre. Estamos num velório aqui em casa.” “O quê? Que aconteceu, meu Deus. Me fale logo.” O Miguel está em prantos o dia inteiro e agora, armamos o velório com orações e luzes apagadas.” “Meu Deus! Estou estarrecida e não estou sabendo de nada. Vamos para sua casa agora. Nossas amigas vão também.”
L – Velório de cachorro vira-lata?
A - Quem diria, amigo leitor, quem tem amigo não morre sozinho.
L – Grato por esta fábula. Ainda dá tempo de eu ir a uma piscina hoje ainda. Estou livre?.




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