NO
BELVEDERE
Acredite
que o meu bairro na cidade de Mingáglia, chamava Belvedere? Fim de rua, gente
pobre, gente feia. Mas nem tudo está perdido. Para nós, naquela época, era um
paraíso. O pobre nasce pobre sem saber e, mesmo assim, também é feliz sem saber.
Eu tinha dito que no meu bairro ou favela
não tinha nada de belvedere e nada para se ver e admirar, mas tinha sim. Eu me
lembrei de uma das casas da vizinhança. Era um bordel, casa de prazer, de
perdição, como diziam os moradores da região.
Até aí, tudo certo. Acontece que no nosso
quintal havia uma mangueira e um abacateiro, localizados bem junto ao muro do
bordel. Era uma casa simples, de três ou quatro quartos, e cheia de mulheres
prostitutas.
Os meus dois irmãos mais velhos descobriram
a mina e subiam nas árvores e ficavam lá tempo sem fim, admirando as mulheres
em volta da piscina, tomando banho de sol.
De lá do alto, gritavam para os irmãos menores:
- Aqui é muito alto. Vocês são pequenos e
não podem subir. É muito perigoso.
Eu e meu irmão da mesma idade ignoramos
essa advertência, mas essa tentativa de proteção parecia meio fora de
propósito. Nós éramos valentes e ousados. O que os dois mais velhos faziam, nós
dois também tínhamos que fazer. Por isso, derrubamos essa advertência e subimos
lá para as alturas. Surpresa geral. Maravilha de belvedere. As mulheres estavam
seminuas, na beira da piscina, tomando sol. Maravilha!! Meu irmão tinha 10 anos
e eu ia fazer 11. Ficamos horas sem fim, observando e nos deliciando.
- Oh! Garoto! Joga uma manga pra mim! -
gritou uma delas. Uma loura de pernas compridas e bem torneadas.
Aí começou o nosso relacionamento de boa
vizinhança. Era manga pra lá e beijinho pra cá. As meninas do bordel encheram
uma cesta de frutas. Eu não podia perder a oportunidade e gritei pra uma delas:
- Amanhã eu vou levar um cesto de mangas
maduras pra você. Posso ir?
- Vem de tarde, benzinho. Fico esperando
você.
Meu irmão menor não ouviu bem o que eu
combinava e nem percebeu as minhas mais puras intenções.
Foi assim.
No dia seguinte, fui lá. Os meus irmãos mais velhos já eram fregueses
constantes. Para mim, foi a primeira visita. Eu acho que já tinha doze anos.
Daí pra frente, eu não queria mais namorar as garotas. Meus olhos tinham outros
objetivos mais apurados. Eu não precisava mais de subir nas mangueiras, mas meu
irmão menor, toda hora, estava querendo apanhar mais mangas, no alto das
árvores. Um dia, já mais sabido, achou que, se subisse no abacateiro, poderia
colher outro tipo de fruta e teria uma visão mais ampla. Minha mãe nunca ficou sabendo disso. Ela
apenas dizia que os garotos pequenos eram os mais habilidosos apanhadores de
frutas no quintal.
Referência:
Alvarenga, Rogério. Em nome do filho. Pag. 27/28, Ed. 3I, Belo Horizonte,Br,
2014.
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